O desconhecido e o incompreensível como base do terror

Histórias curtas iniciais do piloto, publicadas em álbum pela primeira vez
Leitura comentada pode agradar a fãs do piloto e interessados por BD

Representar o terror é, desde sempre, algo difícil de concretizar,talvez porque é uma das emoções mais fortes que o ser humano pode ter e cuja origem varia de pessoa para pessoa.
“Urlo – Grito no escuro”, uma edição da Escorpião Azul que corre o risco de passar despercebida entre tantas novidades com que a BD nos tem presenteado nos últimos anos, consegue fazê-lo assente em dois vectores principais: o desconhecido e o incompreensível.
A história começa de noite, horário ideal para todos os terrores, quando um homem é parado na estrada por alguém que pede socorro.. Apanhado na armadilha, é levado para uma construção próxima, onde é mutilado para alimentar uma estranha criatura. Melhor, para lhe abrir o apetite, porque o verdadeiro pesadelo ainda está por começar.
Sem qualquer explicação, sem dados para que a razão o processe, é-lhe dito que terá de correr. Correr o mais que puder, para atravessar a floresta, cruzar a ponte e chegar ao barracão que existe do outro lado. Se atingir esse objectivo será libertado. Pormenor não displicente: a besta que já o provou, vai ser libertada no seu encalço.
Ferido, aterrorizado, não conhecendo o animal que o persegue, ignorando porque foi escolhido para aquela provação, o protagonista, sem nome o que adensa o mistério e a curiosidade, desata a correr.

Cronologicamente, “O grande desafio” (datado de 1959) é considerada a primeira aventura de Michel Vaillant, mas a verdade é que antes desse conjunto de corridas por vários continentes e em diferentes competições, o futuro campeão do mundo já tinha protagonizado pequenas narrativas.
As primeiras, estão agora reunidas em “Michel Vaillant – Histórias Curtas #1 – Origens”, que a ASA fará chegar às livrarias portuguesas já a partir de dia 13. O arranque faz-se em 1956, quando o autor, Jean Graton, decidiu trocar a revista “Spirou” pela “Tintin”, para poder escrever as suas próprias histórias, propondo as aventuras de um piloto automóvel.
De um jovem algo inconstante e imaturo às primeiras vitórias nas estradas e pistas, este álbum permite conhecer a génese do mais famoso piloto dos quadradinhos, em paralelo com o desenvolvimento do seu mundo familiar e profissional. E permite igualmente ver aparecer as famosas onomatopeias que ficaram como uma das imagens de marca das bandas desenhadas assinadas por Graton.
Se por um lado este é um livro naturalmente aconselhável para os fãs de Michel Vaillant, pois nele irão (re)encontrar histórias que embora já publicadas em diversas revistas, eram inéditas em álbum em Portugal até hoje, por outro lado, também irá satisfazer aqueles que gostam de ir mais além da simples leitura das bandas desenhadas, para saberem um pouco mais sobre a génese dos heróis e a forma de trabalhar dos autores, pois nela podemos descobrir a remontagem de pranchas para uniformização de formatos na publicação em álbum, narrativas criadas especificamente para publicidade a marcas e histórias em torno da família e da marca Vaillant.
Se gráfica e tematicamente há diferenças assinaláveis entre os primeiros relatos do álbum, em que Jean Graton ainda tacteava à procura do caminho para o seu piloto, e os que encerram a edição, nestes últimos o autor explana já a sua visão das corridas automóveis, explorando provas bem conhecidas, dos circuitos de Fórmula 1 às de resistência e passando pelos ralis, sob um olhar a um tempo realista e apaixonado, que o faz salientar um código de conduta ideal, apesar das características bem humanas das suas personagens.

Michel Vaillant – Histórias Curtas #1 – Origens
Jean Graton
ASA
64 p., 17,50 €


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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