Luís Louro: “IA devia significar Inteligência Alheia, porque o que produz é retirado e plagiado de trabalhos de outros!”

No Dia do Desenhador, o artista fala de si e dos 30 anos do Corvo

O Dia do Desenhador, comemorado a 15 de Abril, data de nascimento de Leonardo Da Vinci, foi o pretexto para uma conversa com Luís Louro, um dos mais populares desenhadores portugueses de BD.
Segundo se lembra, quis “ser desenhador desde sempre… O útero da minha mãe devia estar todo rabiscado por dentro…!”, diz, com uma gargalhada. E prossegue: “em criança” para ser feliz bastava “ter um lápis e papel”. Ser “astronauta era outra possibilidade, pois andava muitas vezes de cabeça na lua!”.
Num tempo em que “não existiam tutoriais online ou workshops de BD”, teve de ser “um verdadeiro autodidacta”. Com a primeira BD publicada em 1985, olha “para trás com orgulho, por ter feito sempre um trabalho honesto, no limite das capacidades, com paixão, dedicação e por vezes (muita) frustração”. Hoje, continua a desenhar “com o mesmo entusiasmo, se não mais… Em parte devido aos leitores que têm sido fiéis e nunca deixaram de acreditar”.
A primeira obra a solo foi “O Corvo”: “a editora pediu uma história sobre Lisboa” e Louro resolveu “criar uma espécie de anti-herói lisboeta” que se identificasse com ele e com o seu sentido de humor. Foi nesse dia, que se tornou “não um argumentista, mas sim um contador de histórias” .
Diz-se “que o Corvo é trapalhão, alienado ou mesmo alucinado”, mas Luís Louro discorda: “o Corvo é um verdadeiro herói, não tem qualquer capacidade especial ou jeito seja para o que for, e no entanto resolveu dedicar-se a ajudar os outros!”.
30 anos e 7 álbuns depois, acredita que “o universo do Corvo se tornou mais consistente e cresceu exponencialmente; em termos de arte, chegou finalmente ao estilo gráfico” que sempre imaginou. E confessa: “o Corvo tem crescido a par e passo comigo como autor de BD”.
Louro tem aproveitado os álbuns do Corvo, supostamente um super-herói, para abordar temas como o bullying, o desajustamento social ou, no recente “O Despertar dos Esquecidos” (Ala dos Livros), o abandono a que são votados os idosos… Apesar “de gostar de aventuras e de humor”, também acha importante “fazer critica social e abordar assuntos sérios, actuais e relevantes”. Odeia o “novo politicamente correto” e tem “leitores e amigos que dizem” que anda sempre “no fio da navalha, empoleirado no muro…” E finaliza com uma gargalhada: “qualquer dia ‘esbardalho-me’ todo!”.
Sendo a BD portuguesa parca em heróis, no sentido de personagens recorrentes, na sua bibliografia há vários. O desenhador diz que sempre preferiu “ler aventuras de heróis que já conhecia, do que histórias isoladas” e que em termos criativos, isso “permite desenvolver as personagens de um modo mais consistente e que os leitores as vão conhecendo cada vez melhor”.
Tema incontornável quando se fala de desenho nos nossos dias, a Inteligência Artificial é “algo que assusta bastante” e que abomina mesmo. E desenvolve: “Não só tira trabalho aos verdadeiros artistas, como não cria nada de novo. Não confundam as coisas… NÃO é mais uma ferramenta, porque as ferramentas não funcionam sozinhas; para as usares, tens de ter o talento para criar e desenhar, o que não acontece com a IA! O próprio nome diz tudo ‘ARTIFICIAL’! Na verdade, IA devia significar Inteligência ALHEIA, porque o que ‘produz’ é retirado e plagiado dos trabalhos de outros!”.
A finalizar, deixa um conselho a quem quer ser desenhador: “estudem muito e candidatem-se à NASA para serem astronautas…!”

Perfil

Chama-se Luís Louro e nasceu em 1965 em Lisboa, cidade que é cenário de muitas das suas bandas desenhadas. Da sua prancheta, com o seu estilo personalizado, saltaram obras como “Alice”, “Watchers”, “Os Covidiotas” ou “Dante” e personagens como Jim del Monaco, Roques e Folque ou o Corvo, que este ano comemora 30 anos, com o sétimo álbum, “O despertar dos esquecidos”, e uma grande exposição no Coimbra BD, de 25 a 28 de Abril.


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

Futura Imagem