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Georges Bess: “Não escolho os livros que adapto pelos monstros, mas…”

Depois de “Drácula”, a sua adaptação de “Frankenstein” acaba de ser editada em português

Georges Bess aproveitou a oportunidade para ficar mais uns dias e descobrir os encantos da cidade do Porto.
Foi a oportunidade para um encontro com o Jornal de Notícias, durante o qual evocou a sua longa carreira e, em especial, os dois livros disponíveis em português em edições de A Seita : “Drácula” e “Frankenstein”, este último lançado naquele evento.
Nascido em 1947, recorda que desenha “desde pequeno”. Aos 20 anos encontrou “uma sueca e atrás do amor foi para a Suécia”. Evoca “um país muito acolhedor e interessante” mas, “como tinha de ganhar a vida, o desenho pareceu uma via interessante”, Começou por ilustrar “livros de aprendizagem de francês”, mas depois decidiu “tentar a sorte na banda desenhada”. Foi contactando “diversos editores”, até que um dia lhe pediram para “substituir um autor que estava doente” As substituições foram-se sucedendo, permitindo-lhe demonstrar uma das suas principais características: a versatilidade do traço, capaz de se adequar às necessidades.
Do seu período escandinavo, evoca “a participação na versão local da revista ‘Mad’, a personagem ‘Dante’ e, principalmente, o desenho de ‘The Phantom’ (‘Fantasma’), lido e relido em criança, nas tiras recortadas dos jornais”. Mais uma vez, a característica camaleónica do seu traço prestou-se a desenhar “o herói durante cerca de 15 anos, nas diferentes épocas e locais de acção, por vezes aproximando-se do traço de autores que admirava, como Joe Kubert”. Inicialmente “destinado ao mercado sueco, seria distribuído depois na Escandinávia e em dezenas de países”. Numa época em que “se trabalhava sem contrato”, nunca viu “um cêntimo de royalties dessas publicações”.
De regresso a França no final da década de 1980, conheceu o chileno Alejandro Jodorowsky, cineasta, dramaturgo, escritor e argumentista de BD que lhe propôs a série “Le Lama Blanc” (parcialmente editada em Portugal). Foi um “conhecimento fortuito, mas a sua proposta veio ao encontro de uma viagem ao Tibet que tinha realizado anos antes” e o influenciou fortemente”. No mesmo período, com o mesmo escritor desenvolveu uma surpreendente parceria: “um conjunto de histórias infantis publicadas no “Le Journal de Mickey” francês”.
O sucesso da série, inicialmente “pensada para um filme que nunca se realizou, prolongaria a colaboração em ‘Anibal Cinq’ e ‘Juan Solo’”. Mais uma vez, “os estilos diferentes permitiam diversificar e distrair”.
A partir daí, Bess tornou-se “autor completo”. Recorda que “a partir de certa altura, Jodorowsky apenas fornecia a ideia base oralmente”, tendo ele que “escrever o guião e os diálogos”. Por isso, pensou que se já fazia “tudo sozinho, também podia criar histórias próprias”.
Há poucos anos, na sequência de uma operação ao estômago, tendo que ficar imobilizado durante seis meses, começou a fazer desenhos, “a preto e branco, num estilo fantástico; depois, ia ampliando a imagem inicial por várias folhas, obtendo enormes quadros. Eram exercícios de desenho puro, sem qualquer objectivo. Um galerista viu-os, gostou muito e propôs expô-los; foram vistos por um editor que me convidou a fazer uma adaptação de ‘Drácula’ naquele estilo”.
Bess confessa que a princípio não se sentiu “muito atraído” mas, “após uma visita a Londres, onde passeou “no bairro em que Bram Stoker viveu, nas ruas que ele percorreu” e visitou “um cemitério extraordinário e casas góticas muito interessantes, senti uma enorme vontade de o desenhar”.
Depois de “Drácula” (edição portuguesa de A Seita), seguiu-se “Frankenstein”. “São duas obras lidas muito novo, marcantes e cuja influência ainda persiste”.
Gostou de estar no Maia BD, “um pequeno festival recém-nascido, simpático e acolhedor”, mas a sua preferência vai para estar em casa a desenhar. Trabalha “de manhã até ao fim da tarde, de domingo a sábado. Um dia, o desenho a lápis, no seguinte a passagem a tinta. Um álbum de 200 páginas, demora 400 dias a concluir. Mais o tempo de escrita!”
Com “Drácula”, começou por “ler o original”. Depois, colocou-o de lado e desenhou-o “como tinha sentido, realçando as emoções, sem utilizar demasiado o texto original”. Mesmo assim, em obras claramente visuais, mas Bess afirma ter “tentado valorizar a escrita, mantendo alguns termos da época, mas actualizando a linguagem para que seja compreendida hoje”.
A opção pelo preto e branco vem do facto “que torna os desenhos mais fortes, dá-lhes maior impacto”. Nestas obras, mudou “o formato, a técnica, a planificação é muito diversificada, as cenas podem estender-se por páginas duplas, sem seguir modelos mais tradicionais. Poder fazê-lo, ter esta liberdade, é magnífico!” revela claramente satisfeito.
Actualmente, trabalha numa terceira adaptação de “um romance clássico, de um dos mais conhecidos autores franceses”, que ainda não pode divulgar pois encontra-se no segredo dos deuses e dos editores, entre os quais A Seita que já garantiu a edição portuguesa. Curiosamente, como as outras duas, de certa forma também tem um ser deformado como protagonista. Bem-disposto, Bess adianta que não escolhe “as obras a adaptar por terem um monstro, mas…”


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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Maia BD traz Georges Bess e Canizales a Portugal

Filipe Melo, Nuno Markl e Luís Louro também estarão presentes

Apresentado oficialmente ontem à noite, numa sessão que contou com a exibição dos filmes portugueses que estiveram pré-nomeados para os Óscares, o Maia BD, promete um programa sólido e nomes sonantes para a sua primeira edição, que vai decorrer de 16 a 18 de Junho, no Fórum da Maia.
A organização garantiu a presença de cerca de duas dezenas de autores nacionais de BD, desde nomes ligados à BD mais popular para um público mais alargado, como Luís Louro, Filipe Melo ou Nuno Markl, até autores mais alternativos e independentes para um público mais especializado, entre os quais se destaca Marco Mendes, autor do cartaz desta primeira edição do festival.
Para além deles, como cabeças de cartaz, surgem dois autores estrangeiros de créditos firmados. Um deles é o francês Georges Bess, autor de uma poderosa adaptação do “Drácula” (edição portuguesa de A Seita, 2021), de Bram Stocker, depois de anos de colaborações regulares com Moebius ou Jodorowski, em séries como “O Lama Branco” ou “Juan Solo”. No Maia BD será lançado o seu novo álbum em Portugal, uma adaptação de “Frankenstein” de Mary Shelley.
Quanto ao segundo autor é o colombiano Canizales que, embora mais identificado com a ilustração infantil, desenhou a adaptação de “Os Maias”, de Eça de Queirós (Levoir/RTP, 2021), integrada na colecção “Clássicos da Literatura em BD”.
No que respeita a lançamentos ou apresentações, o Maia BD, uma iniciativa da Câmara Municipal da Maia através do Pelouro da Cultura, com organização da cooperativa editorial A Seita, confirmou já o “Auto da Barca do inferno” (Levoir), de João Miguel Lameiras e de Joana Afonso, a partir da obra de Gil Vicente; “Manual de Instruções” (Iguana), de Nuno Markl e Miguel Jorge; “O mangusto” (A Seita), de Joana Mosi; “O Corvo: Laços de família”, de Nuno Markl e Luís Louro; “Umbigo do Mundo II” (A Seita) de Penim Loureiro e Carlos Silva; “Dog Mendonça e Pizza Boy – edição integral” (Companhia das Letras) de Filipe Melo e Juan Cavia.
Com excepção deste último, todos os autores citados estarão presentes, tal como André Lima Araújo, André Diniz ou Bernardo Majer, o vencedor no ano passado do Prémio para Melhor Álbum Nacional no Amadora BD.
De 16 a 18 de Junho, no Fórum da Maia, será possível apreciar originais de Joana Afonso, Juan Cavia e Joana Mosi, estando em fase de negociação com Georges Bess a exposição de pranchas dos seus livros. Os originais de “Juventude”, de Marco Mendes, estarão patentes de 6 a 30 de Junho na Biblioteca Municipal Doutor José Vieira de Carvalho, também na Maia.
A programação do festival inclui igualmente uma Feira do Livro de BD, conversas com alguns dos autores convidados, um painel sobre as adaptações de clássicos da literatura portuguesa na colecção da Levoir e da RTP, sessóes de autógrafos, apresentação e lançamento do projecto BD PALOP, um projecto ProCultura, promovido pelo Instituto Camões com fundos da UE, do qual serão apresentados os sete primeiros livros, um concurso de Cosplay, workhops de BD para vários públicos, orientados por alguns dos maiores nomes da BD nacional, exibição de filmes de animação, participação do colectivo Urban Sketchers, uma comunidade de artistas que desenham ao ar livre, e a presença da Rebel Legion, uma organização internacional de voluntariado dedicada ao Universo da Guerra das Estrelas.


Escrito Por

F. Cleto e Pina

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Jornal de Notícias

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