Etiqueta: Greg Rucka

12 horas a um passo do inferno

A relação pai/filho renovada numa situação limite
Ethan Hawke regressa à BD, de novo em parceria com Greg Rucka

Depois de “Indeh: Uma história das guerras apaches”, o actor, realizador e também argumentista de BD Ethan Hawke regressou a esta arte – e agora ao catálogo português da G. Floy – com “Meadowlark”. E se as semelhanças terminam na renovada parceria com Greg Ruth, a verdade é que mais uma vez deparamos com uma obra intensa e desafiadora, quase apenas diálogo, directo ou intuído, entre um pai e um filho, num romance gráfico que se desenrola num único dia, aliás quase só do nascer ao pôr-do-sol.
O protagonismo é dividido. De um lado, está Cooper, um adolescente revoltado pela separação dos pais, pela nova relação da mãe, pelo abandono que sente por parte do progenitor. Do outro lado – e esta frase é quase um reflexo da forma de ver do jovem – está Jack, antiga glória do boxe (que nunca o foi verdadeiramente) e actualmente guarda prisional na anódina cidadezinha de Huntsville, no Texas. Desse passado violento, para além dos traumas físicos e psicológicos, trouxe também dívidas de favores que não lhe facilitam a vida.
Um conjunto de acasos, de situações recorrentes e de limites da paciência esgotados, obrigam este último a levar o filho para o trabalho no estabelecimento prisional. A presença de ambos, no local errado, na hora errada, ou seja durante uma revolta dos detidos, para além de colocar as suas vidas em risco, inesperadamente vai acabar por os aproximar e levá-los a (re)descobrirem o que têm em comum e os sentimentos que nutrem um pelo outro.
Relato marcado por muita tensão, acção violenta, situações limite levadas ao extremo e pela obrigação de tomadas de decisão instantâneas, “Meadowlark” é acima de tudo uma reflexão sensível e emotiva sobre a inimitável relação pai/filho, tornada chocante pelo contexto de violência extrema, tanto física quanto psicológica, em que o relato decorre.
O desenho realista de Ruth, parco nos traços utilizados, parcialmente cobertos por tons sépia suaves, com a expressividade de faces e gestos a predominar sobre os pormenores dos cenários, numa planificação ampla em que o número de vinhetas por página é muito reduzido, contribui para realçar as emoções e o movimento, arrastando-nos ao longo das horas em que tantas vezes Cooper e Jack vão estar a um passo do inferno, real e literalmente falando.

Meadowlark
Ethan Hawke e Greg Rucka
G. Floy
256 p., 35,00 €


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

Futura Imagem

Uma interminável sucessão de dias

Entre a embriaguez da vida eterna e a solidão que ela acarreta
Segundo volume de “A Velha Guarda” já disponível em português, enquanto não estreia a sequela com Charlize Theron

Enquanto se aguarda pela sequela de “A Velha Guarda”, que a Netflix estará a preparar para este ano, a G. Floy editou em português, mesmo no final de 2022, “Força multiplicada”, o segundo volume da banda desenhada que esteve na origem do filme que Charlize Theron protagonizou em 2020.
O conceito base desta obra criada por Greg Rucka é fácil de explicar: existem no nosso planeta algumas pessoas que são imortais. Ou quase. Podem ser esfaqueadas, baleadas, explodidas ou sofrer qualquer outro tipo de ataque, que possuem a capacidade de se reconstituir e recuperar. Esse poder vai-se deteriorando com o tempo e um dia, passadas dezenas, centenas ou milhares de anos, acabarão por não conseguir ressuscitar.
Esta premissa permitiu a Rucka, e ao desenhador Leandro Fernández, criarem uma série de acção explosiva e espectacular, extremamente dinâmica e com adrenalina a sair por todos os poros. O filme dirigido por Gina Prince-Bythewood conseguiu transpor para o ecrã o ritmo vibrante do original e recriar algumas das cenas mais marcantes, mas “Força multiplicada”, pelos níveis de violência e destruição atingidos, promete levantar grandes dificuldades aos técnicos de efeitos especiais.
Este segundo volume, centrado no combate a uma rede de tráfico humano, fica também marcado pelo aparecimento de Noriko que, no seguimento de um naufrágio, passou os últimos cinco séculos no fundo do mar a ressuscitar e a afogar-se num interminável ciclo sem fim. Revoltada por se sentir abandonada por Andy, que estava com ela na altura da tragédia, vem disposta a fazê-la pagar pelo que aconteceu.
A par dos vibrantes excessos visuais que fazem dela uma excelente banda desenhada de aventura e acção de contornos fantásticos, mais uma vez “A Velha Guarda” vem questionar temáticas como a vida e a morte e a solidão associada à imortalidade, quando desaparecem todos aqueles que num determinado momento amaram e foram amados e/ou importantes, levados pela voragem do tempo.
E também o que fazer com essa imortalidade. Visitar lugares, acumular conhecimento, ajudar pessoas, trabalhar pelo bem comum… podem ser algumas respostas positivas – que poderão sempre ter o oposto em negativo – mas mesmo isto pode acabar por parecer inútil e vazio quando a sucessão de dias não tem fim.

A Velha Guarda #2 Força Multiplicada
Greg Rucka e Leandro Fernández
G. Floy
168 p., 24,00€


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

Futura Imagem