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Só muda a cor das ditaduras

Agitar memórias para evitar que as coisas se repitam. Romance gráfico aborda a vida pelos olhos de um adolescente em Praga na década de 1950.

Com a comemoração dos 50 anos do 25 de Abril ainda como pano de fundo, permanece a necessidade de lembrar o que a revolução quis mudar e fazer e não deixa de ser uma coincidência agradável a publicação agora deste livro, “Jonas Fink: Inimigo do povo”, cuja acção decorre numa ditadura de outro tom, a Checoslováquia “vermelha” do bloco soviético da década de 1950, mas em que os métodos repressivos e os efeitos que provocavam eram indiscutivelmente similares.
Iniciada em 1992, a obra nesta primeira edição em português pela Arte de Autor, foi dividida em dois tomos; o primeiro inclui “A infância” (distinguida em Angoulême como melhor álbum de 1995) e “A aprendizagem”; o segundo, a lançar no último trimestre deste ano, recolherá “O livreiro de Praga”.
Como bom romance desenhado que é, “Jonas Fink” centra-se no adolescente que dá título à obra. Filho de um intelectual, assiste à prisão do pai com apenas 11 anos, e irá experimentar na pele as consequências de ‘herdar geneticamente’ a condição de ‘inimigo do povo’: a proibição de continuar a estudar; o afastamento da maioria dos antigos colegas devido à sua ‘condição’; a necessária sujeição a trabalhos menores, como pedreiro ou ajudante de canalizador, que a sua excelência nos estudos não pareciam indicar… Por tudo isto, Jonas terá de crescer aceleradamente, passando em poucos anos de um adolescente despreocupado e feliz para um jovem na flor da idade que tem de ter cuidado com o que diz, com o que faz, com quem se dá.
Bons amigos onde menos esperava e a companhia de um grupo de jovens que buscam nos livros proibidos uma réstia da liberdade que a vida lhes nega e onde conhece a bela Tatiana, filha de um oficial do regime, por quem se apaixona, farão com que Jonas comece a perceber que, à sua dimensão, também pode resistir e aspirar a mais do que aquilo que o poder lhe quer conceder.
Retrato realista e credível da opressão de um regime sobre um povo, em especial sobre aqueles que pensam ou podem pensar de forma diferente, “Jonas Fink – Inimigo do povo”, servido por um traço agradável e belas cores, para além de uma boa leitura, é importante como memória de tempos que lá, como cá, como em tantos outros locais, ninguém deve querer viver outra vez.

Jonas Fink – Inimigo do povo
Vittorio Giardino
Arte de Autor
160 p., 29,95 €


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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