O grito de desespero de um homem que corre pela sua liberdade
Desenho impreciso e agreste marca ritmo e aumenta a adrenalina
Representar o terror é, desde sempre, algo difícil de concretizar,talvez porque é uma das emoções mais fortes que o ser humano pode sentir e cuja origem varia de pessoa para pessoa.
“Urlo – Grito no escuro”, uma edição da Escorpião Azul, consegue fazê-lo assente em dois vectores principais: o desconhecido e o incompreensível.
A história começa de noite, horário ideal para todos os terrores, quando um homem é parado na estrada por alguém que pede socorro. Apanhado na armadilha, é levado para uma construção próxima, onde é mutilado para alimentar uma estranha criatura. Melhor, para lhe abrir o apetite, porque o verdadeiro pesadelo ainda está para começar.
Sem qualquer explicação, sem dados para que a razão o processe, é-lhe dito que terá de correr. Correr o mais que puder, para atravessar a floresta, cruzar a ponte e chegar ao barracão que existe do outro lado. Se atingir esse objectivo será libertado. Pormenor não displicente: a besta que o provou, vai ser lançada no seu encalço.
Ferido, aterrorizado, desconhecendo que animal é aquele que o persegue, ignorando porque foi escolhido para aquela provação, o protagonista sem nome, o que adensa o mistério e a curiosidade, desata a correr.
Numa história quase sem diálogos, com o silêncio ensurdecedor a aumentar a tensão, o desenho torna-se ainda mais preponderante para transmitir as emoções. Para isso, umas vezes o leitor assume os olhos do protagonista, vendo o que ele vê, os obstáculos de que tem de se desviar; outras, afasta-se dele, para apreciar a sua postura, o constante olhar para trás, as breves paragens para retomar forças. O traço de Luca Conca é até agreste e impreciso, embora legível e com o dinamismo necessário para imprimir um ritmo de cortar o fôlego e fazer subir a adrenalina. Embora, a abrir e a fechar, nas únicas páginas coloridas da edição, mostre potencialidade para outro tipo de registo, num contraste marcante, visual e narrativo, com o negrume do relato e o cinzento que impera na maioria das pranchas de “Urlo”.
Como em todas as narrativas de terror, o final imprevisto aumenta a sensação de inquietude que perpassa por todo o livro e parece dar voz à incómoda pergunta: e se nos acontecesse a nós?
Urlo – Grito no escuro
Gloria Ciapponi e Luca Conca
Escorpião Azul
104 p., 16,00 €
Escrito Por
F. Cleto e Pina
Publicação
Jornal de Notícias