Partir do que é conhecido para seduzir o leitor
Personagens de Julio Verne e Rudyard Kipling encontram-se para salvar o mundo
Um primeiro passo para conquistar o leitor, é dar-lhe como ponto de partida algo que ele já conheça, no caso de “Nautilus”, o célebre submarino do Capitão Nemo e este vilão visionário que Jules Verne criou em “20000 léguas submarinas” e fez regressar em “A ilha misteriosa”. E, se versões em banda desenhada de romances célebres têm sido utilizadas para tentar conquistar leitores para a literatura, esta é uma outra via que até poderá ser mais eficaz e sedutora. De caminho para Nemo, os autores deste livro co-editado entre nós pela Arte de Autor e A Seita, aproveitam outro facto conhecido e histórico: o confronto latente entre a Grã-Bretanha e a Rússia nos últimos estertores do século XIX, pelo controlo de territórios indianos.
À frente do relato, como protagonista, surge Kimball O’Hara, o Kim imaginado por Rudyard Kipling no romance homónimo, um irlandês com sangue indiano e mentores tibetano e britânico, agora adulto e agente dos ingleses. Tão fascinante pela sua origem dupla e díspar quanto pela forma decidida e independente como actua, Kim vê-se apanhado numa armadilha que fez dele traidor e rastilho para o conflito, sendo a solução recuperar uns documentos num navio afundado a grande profundidade. A única forma de o conseguir é recorrendo ao desaparecido capitão Nemo, prisioneiro numa prisão na Sibéria, e ao seu mítico submarino Nautilus.
Com este pressuposto, o argumentista Mathieu Mariolle e o desenhador Guénaël Grabowski levam-nos numa grande aventura, com ritmo alucinante, personagens fortes, complexas e convincentes, situações impossíveis e perseguições de cortar a respiração, em cenários exóticos, imponentes ou deslumbrantes, fiquem eles no topo de montanhas geladas ou no mais profundo dos mares, com Kim a tentar impedir mais uma guerra fratricida entre os impérios dos czares e britânico e conseguir provar aos que o perseguem e aos que o conhecem, a sua inocência.
O traço realista de Grabowski e a forma como ocupa muitas das páginas até às margens, esquecendo o habitual contorno branco, contribui para a espectacularidade deste volume inicial de “Nautilus”, cujo final abrupto deixa os leitores sedentos da continuação deste tríptico, que ostenta a aventura e a grandiosidade das obras de Verne e o suspense dos grandes romances de espionagem.
Nautilus #1 – O teatro de sombras
Mariolle e Grabowski
Arte de Autor/A Seita
68 p., 19,95€
Escrito Por
F. Cleto e Pina
Publicação
Jornal de Notícias