Um homem despede-se – de forma pungente. Um homem parte. Só, com uma mala de mão. Com poucos pertences e uma fotografia. Talvez o mais valioso de todos. Uma fotografia de uma família, a sua. Ele, a mulher e uma filha pequena. O homem parte para longe. Para o outro lado de um vasto oceano. Para um admirável – mas assustador – mundo novo. De linguagem incompreensível. De escrita indecifrável. Com novos animais, novas plantas, novos alimentos. Lá chegado, só, tem que arranjar alojamento, um emprego.
Esta é a história de muitos (de quase todos?) os emigrantes: abandonar os entes queridos para procurar melhores condições de vida (sonhos?). E é também a história do notável “Là où vont nos pères” (Dargaud). Notável porque é um enorme romance mudo, feito de imagens aparentemente soltas, trabalhadas a lápis, em incómodos tons de cinzento e sépia, por Shaun Tan. Notável pela forma como explode em imagens de página inteira ou as monta até 30 por página, como forma de apressar ou retardar o ritmo da narrativa, de revelar mudanças de espírito, de nos surpreender numa paisagem, de nos reter num pormenor, de nos emocionar numa descoberta ou com um revés. Notável na forma como retrata o desconhecido, como transmite emoções e sentimentos, como ilustra o passar do tempo.
Notável, ainda, porque diz, porque faz acreditar que a integração é possível, que os sonhos se concretizam.
Escrito Por
F. Cleto e Pina
Publicação
Jornal de Notícias