Autor: Júlio Moreira

Exposição: À Procura da BD de Abril

No ano em o 25 de Abril faz 50 anos a Assembleia da República aprova um dia de celebração da BD nacional.

O que é justo, porque a Banda Desenhada foi, ao longo destes 50 anos de democracia, uma linguagem artística longamente utilizada e empenhada na celebração dessa mesma democracia e dessa data libertadora. Amor com amor se paga.

Fomos, portanto, “À Procura da BD de Abril”, criando uma exposição que nos mostra uma série de publicações onde o 25 de Abril é celebrado ou onde os ventos libertários de Abril de algum modo contaminaram estética e tematicamente obras e autores.

Completa-se a exposição com a mostra de originais de um dos mais reputados autores nacionais, José Carlos Fernandes, e da sua obra “A Revolução Interior” com argumento da dupla João Ramalho Santos e João Miguel Lameiras, produzido por ocasião dos 25 anos do 25 de Abril mas ainda actual e recentemente reeditada (A Seita).

de dia 18 de Outubro a 9 de Novembro

com inauguração dia 18 de Outubro pelas 21h30, assinalando o Dia Nacional da Banda Desenhada Portuguesa com intervenções de Eduardo Paz Barroso e Marco Mendes

e encerramento dia 9 de Novembro, pelas 16h00, com uma conversa conduzida por Pedro Cleto com os dois argumentistas da obra A Revolução Interior – À Procura do 25 de Abril: João Ramalho Santos (argumentista e critico de BD) e João Miguel Lameiras (editor e argumentista de BD).

na sede da

Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto

Rua Rodrigues Sampaio, 140
4000-424 Porto

Organização Bedeteca / Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto

Apoio A Seita CRL

Doações — Um Breve Relance

A Bedeteca Comicarte, promovida pela Comissão de Jovens de Ramalde nos anos 90, constituiu um acervo de livros graças aos apoios que, na altura, foram conseguindo com a doação de editoras como a Asa, a Edinter, a Meribérica /Liber, a Editorial Futura, a Verbo etc.

O acervo que a Bedeteca hoje já disponibiliza — herdado do trabalho desenvolvido nessa altura — não estaria disponível se não tivesse existido essa colaboração e boa vontade, e o relançamento do projeto passa, portanto, também por reativar essa solidariedade e interesse por parte das editoras nacionais.

Estamos seguros de que, como nós, também estas estarão convictas que a leitura pública é sempre a base do crescimento dos hábitos de leitura. E que o crescimento dos hábitos de leitura leva ao crescimento de um público interessado, que desenvolve o seu gosto e as suas preferências e contribui para o crescimento do mercado e do consumo. Em nosso entender, a disponibilização de títulos de banda desenhada não será excepção.

Algumas destas editoras são já nossas parceiras neste objectivo.
Já aderiram, portanto, a este desafio.
E porque consideramos que nada melhor do que a visão do editor, pedimos aos seus responsáveis que escolhessem uma peça — um livro — de entre aqueles que doaram e que desenvolvessem num curto texto aquilo que lhes parece de realçar nessa publicação.

Deixamos aqui alguns dos testemunhos já produzidos:

Para uma “bedeteca” é fundamental existir algum conteúdo que seja meta-conteúdo de BD, reflexão sobre a BD ou mesmo, reflexão sobre as reflexões sobre a BD. E quando esse conteúdo vem sob forma ele próprio de BD, melhor ainda! “Em Busca do Tintin Perdido”, do brasileiro Ricardo Leite”, que editámos no nosso país, é exactamente isso, uma viagem semi-autobiográfica pela vida, pelas experiências, pela imaginação do autor, reflecte sobre uma vida a reflectir sobre BD, as suas personagens, autores e obras. E para mais, magnificamente desenhado, um livro que faz surgir o panorama da BD das últimas décadas de uma maneira tremendamente viva.

—José Hartvig de Freitas, A Seita


Livro: L’Orso Borotalco e la Bambola nuda italiana.
Este livro obedece a um ritmo sequencial de 4, 3 e 1 imagem, pontuado por diálogos entre um jarro e um copo ao longo do arco de um dia, segundo uma linguagem entre a banda desenhada e o cartoon.

—Diniz Conefrey, Quarto de Jade


Escolho o “Cantiga d’Erasmo”.
Este fanzine foi elaborado no outono de 2018, por ocasião de ter sido artista convidada na YCON Paris desse mesmo ano. Não querendo aparecer sem algo inédito, elaborei uma história curta sobre dois estudantes de erasmus em viagem de fim-de-semana que se perdiam do seu grupo. Os dois rapazes têm agora de voltar sozinhos para a cidade onde se encontram a estudar, descobrindo coisas que têm em comum e partilhando algumas dores pelo caminho. Foi auto-publicada por mim em inglês e português. O fanzine recebeu posteriormente uma menção de bronze no 13th Japan International Manga Award em 2020.

—Daniela Viçoso


Pedem-me que escreva um parágrafo sobre um dos livros por mim doados, sobre o que nele gosto. Pois bem, não vou escrever sobre um livro mas antes sobre uma colecção: “Príncipe Valiente”, que tive de publicar em espanhol – sim, porque mais do que doador, sou o editor dela – por não ter mercado em português. São 17 volumes com mais de 1700 pranchas da melhor banda desenhada de sempre. A melhor, nem mais nem menos! É a edição com que sonhei durante mais de vinte anos, a edição que, não importava em que língua fosse, ansiava que algum editor fizesse; uma edição que reproduzisse os desenhos do seu autor com nitidez cristalina. Quando descobri que ninguém a fazia porque os detentores dos direitos de autor não tinham em boas condições o material que o permitisse, compreendi que teria de ser eu a fazê-la, restaurando o material existente. E, numa aventura que aqui não há espaço para contar, consegui iniciá-la! Depois, demorei 15 anos a completá-la, tive de lutar contra ventos, marés e ogres, mas consegui! Saiba o leitor, portanto, que entrar na obra imortal de Hal Foster pela primeira vez através da minha edição é quase pisar terreno sagrado.

—Manuel Caldas, Libri Impressi


Para Além dos Olivais – Um livro que reúne 12 autores que abordam o bairro dos Olivais na altura da comemoração dos 600 anos de Santa Maria dos Olivais. São 12 visões sobre 12 espaços como o aeroporto, os “perdidos e achados da PSP, o Shopping Center… em que destaco os trabalhos de Ana Cortesão e Luís Lázaro, sem querer desvalorizar as outras belas peças. Este livro tem um significado pessoal, saiu em 2000, ano em que entrei para a Bedeteca de Lisboa e uma das primeiras tarefas era chatear o Designer que estava atrasado na entrega do livro. Atrasado!? Leiam a BD do Nuno Saraiva, coordenador da antologia, a relatar os seus míticos atrasos deste trabalho, é hilariante, se for verdade, que ele tenha conseguido percorrer a construção, a celebração e a ressaca da Expo 98. Na BD, a auto-depreciação de Saraiva é balançada com a generosidade de João Paulo Cotrim. Ouve-se perfeitamente a voz de Cotrim… Mas… espera lá… é possível ouvir vozes em  BDs? Nesta sim, tal como na página 141 de “Alguns dias com um mentiroso” de Davodeau mas isso já é outra história…

—Marcos Farrajota, Bedeteca de Lisboa


Sabe-se lá porquê mas há uma década, Tiago da Bernarda, um estagiário jornalismo (e sem formação em desenho) fartou-se de ser explorado pelo sistema falido da imprensa social e começou a fazer tiras de crítica a discos de música portuguesa, criando um alter-ego felino, o Gato Mariano, e publicando em plataformas digitais ou em fanzines auto-editados. A Chili Com Carne juntou toda essa produção num “luxuoso” livro que se tornou num compêndio para quem gosta de música. Do Punk ao Hip Hop, dos GNR aos 10 000 Russos, os discos são arranhados ou acariciados pelo Gato. Depois do livro ter saído, o bichano começou a miar para outras bandas mais “fashion”, políticas e sociais, para além de ter arranjado um sobrinho pós-irónico, o Bruninho, para expor as contradições geracionais. Alguém se digne a comemorar os 10 anos de existência deste gato desbocado!

—Chili Com Carne


Quando este livro saiu um suposto crítico de BD não entendia porque havia publicado esta obra em capa dura, ao que parece ela não era digna de tal. Ó feliz ironia, o que diria esse senhor dos dias de hoje, em que se edita os maiores horrores estéticos em desastres ecológicos de capa dura, a cores e papeis grossos? Que diria essa pessoa se soubesse que o Garth Ennis, em Helsínquia, disse-me que não só estava admirado pela edição como lembrava-se da qualidade do trabalho? Christopher Webster auto-publicou o “Malus” em quatro números num fanzine. Ele, Janus e Mike Diana foram a razão que me fizeram criar a MMMNNNRRRG. Sabia que as suas obras únicas iriam desaparecer por serem publicações marginais. Webster que participou em projectos comerciais – há pouco tempo descobri que ele tinha sido publicado em Portugal “Astrologia para principiantes” (Bertrand; 1997) – incluindo uma BD para a grande Kodansha, fartou-se dos formatos pré-estabelecidos das indústrias e realizou este “Malus”, que é uma terra-de-ninguém. Demasiado comercial para o “underground”, demasiado bizarro para o “mainstream”, é um conto de fadas que come pedaços de sci fi, que digere Mangá e regurgita super-heróis para voltar a comer uma “sucessão de factos biológicos”. Merece uma capa dura, claro que sim! E o verniz localizado, by the way!

—Marcos Farrajota, editor da MMMNNNRRRG (2000-20)