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Retrato de gente adulta

De estatura reduzida e grandes cabeças estiveram para se chamar “Li’l Folks” (gente pequena), mas foi como “Peanuts” (amendoins) que surgiram ao público e atingiram um sucesso ímpar dentro e fora dos quadradinhos.

A primeira publicação foi há 60 anos, em menos de uma dezena de jornais norte-americanos, numa tira com quatro vinhetas e desenho ainda algo incipiente, no qual o futuro (anti-)protagonista principal, Charlie Brown, aparecia de passagem apenas nos primeiros dois, sem dizer qualquer palavra. Estas, estariam a cargo de outro rapazinho que na última vinheta disparava: “Não posso com ele!”. Nem Charles Schulz, o seu autor, possivelmente o saberia ainda, mas esta frase definia já o carácter futuro da personagem, que só reapareceria seis tiras mais tarde: anti-herói, depressivo, sem auto-confiança, sonhador mas eterno falhado (no amor como no desporto, nas brincadeiras como nos relacionamentos)… Era a base de um retrato sério e profundo de gente adulta (nunca presente nos quadradinhos) feita a partir de gente pequena, com todos os defeitos (e algumas qualidades) dos grandes.
Porque a Charlie Brown, ao longo dos tempos, juntar-se-iam a refilona e prepotente Lucy, o inseguro Linus sempre a arrastar o cobertor pelo chão, Schroeder o pianista obcecado pela sua arte, a sonhadora e marginal Peppermint Patty, Sally Brown, a maior crítica do irmão, Marcie, a tímida e míope boa aluna… E, claro, o extrovertido Snoopy que, surgido como cão vulgar na tira do dia 4, dois anos depois “pensava alto” pela primeira vez, acabando por assumir pose antropomórfica e tornar-se a estrela da série, fazendo um contraponto entre a vida real dos outros e o seu mundo de fantasia, funcionando quer como consciência crítica do grupo, quer como principal fonte de nonsense, através dos seus diversos heterónimos: escritor famoso, ás da aviação da Primeira Guerra Mundial, chefe de escuteiros, o relaxado Joe Cool, advogado, hoquista, patinador olímpico…
Com eles, baseado num traço simples, quase sem cenários nem pormenores, mas extremamente expressivo e, acima de tudo, eficaz e legível, Schulz, que sempre elaborou a tira sozinho, analisou de forma lúcida e mordaz – por vezes cruel até – meio século da vida da América, inspirado na sua própria experiência.
Considerada a mais bem escrita e influente tira de imprensa, os Peanuts, que chegaram a ser publicados em mais de 2600 jornais em todo o mundo, foram capa das mais influentes revistas e valeram inúmeros galardões ao seu autor, acabaram por saltar do papel que os viu nascer para outros suportes: primeiro o merchandising, nas suas mais diversas formas, depois a televisão (onde o sucesso foi ainda maior, sem que as suas qualidades intrínsecas fossem afectadas), um musical na Brodway, a literatura, onde foram base de teses diversas e tema de livros filosóficos, sociais e religiosos…
E foi assim, com mais altos do que baixos, até 13 de Fevereiro de 2000, quando foi publicada a última prancha dominical original, na qual o autor se despedia, afirmando: “Charlie Brown, Snoopy, Linus, Lucy… nunca os poderei esquecer…”. Curiosamente, um dia antes Charles Monroe Schulz deixara o mundo dos vivos devido a um cancro do cólon.
Agora, 60 anos depois dos primeiros quadradinhos, a data é assinalada a diversos níveis: a Smithsonian National Portrait Gallery de Washington expõe auto-retratos de Schulz, Snoopy junta-se à Unicef para uma recolha de fundos que durará até Novembro de 2011, foi posta à venda uma figura de tiragem limitada reproduzindo o “primeiro” Charlie Brown, a Fantagraphics Books continua a soberba reedição integral da tira (de que a Afrontamento já lançou cinco volumes em português) e a Lacoste lança uma série de pólos com as criações de Schulz a interagirem com o famoso crocodilo da marca.
Mais motivos – como se eles fossem necessários – para que Charlie Brown, Snoopy, Lucy, Linus e os outros permaneçam vivos nas nossas memórias.

[Caixa]

Ainda um grande negócio

60 anos depois da sua criação e 10 após a publicação da última tira diária, os Peanuts continuam a ser um negócio que movimenta milhões.
Em Abril deste ano, a família de Charles Schulz anunciou a venda dos direitos da série à Iconix Brand Group Inc. por 175 milhões de dólares (cerca de 131,5 milhões de euros). Do negócio resultou a criação da Peanuts Worlvide, na qual os herdeiros do autor detêm 20 % do capital. Entretanto, recentemente, esta empresa anunciou que a United Feature Syndicate, com quem Schulz trabalhou desde o início, deixará de distribuir a banda desenhada – cujas 17897 tiras ainda são (re)publicadas diariamente em cerca de 2000 jornais de todo o mundo – passando esta para o serviço Uclick da Universal.
As receitas anuais da marca Peanuts, cujas bandas desenhadas continuam a ser reimpressas diariamente em centenas de jornais de todo o planeta, rondam os 2 mil milhões de dólares e os respectivos direitos permitem um encaixe de 75 milhões de dólares por ano.


Escrito Por

F. Cleto e Pina

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Peanuts vendidos por 175 milhões de dólares

A família de Charles Schulz (1922-2000) e a Iconix Brand Group Inc. anunciaram ontem a compra dos direitos da série Peanuts por 175 milhões de dólares (cerca de 131,5 milhões de euros).

Até agora, eram pertença do United Feature Syndicate, que distribuiu esta popular tira de banda desenhada desde o seu início, a 2 de Outubro de 1950, e da E. W. Scripps. Segundo Jane Schulz, a viúva do criador de Charlie Brown e Snoopy, que exprimiu a sua satisfação pela óptima relação profissional mantida com a United ao longo de quase 60 anos, o negócio, que foi feito de forma amigável, permitirá trabalhar com uma empresa “que tem um grande respeito pelas personagens e pelo espírito com têm sido tratadas pela família”.
A Iconix Brand Group Inc., uma empresa vocacionada para o licenciamento de grandes marcas para revendedores e fabricantes, especialmente nas áreas de calçado e vestuário, ficará com 80 % da joint-venture agora estabelecida, ficando os herdeiros de Schulz com os restantes 20 %.
Apesar de a tira ter terminado há uma década, devido ao falecimento do seu criador, os dissabores quotidianos de Charlie Brown, Lucy ou Linus são ainda publicados diariamente em cerca de 2000 jornais de todo o mundo. A Iconix estima que a marca Peanuts, licenciada em mais de 40 países, gera receitas anuais na ordem dos 2 mil milhões de dólares, e espera que os respectivos direitos permitam um encaixe de 75 milhões de dólares por ano.
Algumas vozes aventam já a hipótese de a família de Schulz, que durante meio século escreveu e desenhou a série sozinho, sem recurso a qualquer colaborador, vir a autorizar a continuação dos Peanuts por outro autor.
Jacquelen Cohen, da editora Fantagraphics Books, declarou ao site Newsarama esperar que o negócio não afecte em nada a edição integral dos Peanuts, de que já foram publicados 13 dos 25 tomos previstos, uma colecção multi-premiada que em Portugal é seguida pelas Edições Afrontamento que prevêem lançar o sexto volume já em Maio.


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F. Cleto e Pina

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Originais de BD rendem milhares

Longe vai o tempo em que a banda desenhada era olhada como uma coisa para crianças e em que os desenhos se perdiam ou ficavam esquecidos nas redacções das revistas e jornais que os publicavam. Hoje a BD tem o estatuto de arte – a 9ª – e os seus originais podem valer milhares de euros.
No passado fim-de-semana, no leilão Vintage Comic and Comic Art, organizado pela famosa Heritage, foi estabelecido um novo recorde para um original dos Peanuts. A prancha dominical de 10 de Abril de 1955, assinada por Charles Schulz, mostrando Charlie Brown sozinho no campo de basebol, debaixo de um dilúvio, foi arrematada por 113.525 dólares (cerca de 76.500 €). Esta foi a primeira vez que um desenho de Schulz ultrapassou a barreira dos 100 mil dólares.
Alguns dias antes, em Paris, numa outra venda pública de originais de banda desenhada, foi apurado um total de um milhão e trezentos mil euros, sendo Tintin a estrela do leilão. No ano em que se comemora o centenário do nascimento do seu autor, uma prancha com uma única vinheta da versão de 1941 do “Caranguejo das Tenazes de Ouro”, dedicada e assinada por Hergé, atingiu os 70.000 €, um exemplar de “Tintin au Pays des Soviétes”, de 1930, autografado e numerado (3 de uma tiragem de 1000 exemplares) foi vendido por 42 mil euros, e um esboço da capa do álbum “As jóias da Castafiore” (1963), anotado por Hergé no verso, chegou aos 48.000 €.
Na mesma altura foram também vendidos originais de Moebius (51.000 € para a primeira prancha de “Arzach”), Bilal (a capa de “Le vaisseau de pierre” por 44.000 euros) ou Franquin (30.000 euros por um desenho a tinta de “Le fou du Bus”).
A um outro nível, no final de Outubro, um exemplar (dos sete conhecidos) da revista “Amazing Fantasy #15”, com a primeira aventura do Homem-Aranha foi vendido por 227 mil dólares (153 mil euros), tornando-se a mais cara revista de BD de sempre da década de 1960.


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F. Cleto e Pina

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