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Humpá-Pá completa meio século

Criação de Goscinny e Uderzo é anterior a Astérix; Reedição portuguesa prossegue em Maio

Completam-se hoje 50 anos sobre a estreia de Humpá-Pá, o pele-vermelha, na revista “Tintin” belga, possivelmente a mais bem sucedida criação conjunta de René Goscinny e Albert Uderzo, a seguir a Astérix, claro está.
Mas poderiam ser 57 anos, pois os primeiros esboços do herói datam de 1951. Com Goscinny recém-chegado dos Estados Unidos, o fascínio pelo velho oeste era evidente, mas a abordagem humorística, no formato tiras de imprensa, não surtiu os efeitos desejados e Oumpah-pah (no original) teve que passar mais alguns anos na gaveta das (geniais) ideias de Goscinny.
Quando renasceu, tinha sofrido alterações de monta. Primeiro, adoptava o formato tradicional da BD franco-belga, depois, o grafismo de Uderzo tinha-se depurado e era mais solto, de traço arredondado, bem dotado de sentido de movimento, legível, expressivo… Finalmente, Goscinny, já espraiava a sua ironia fina e o seu sentido de humor apurado, revelado quer graficamente, quer nos jogos de linguagem, que viria a mostrar-se em todo o esplendor em Astérix.
Humpá-Pá, nesta nova existência, recuava para o século XVIII, em pleno conflito entre (índios,) britânicos e franceses pela posse do território dos futuros Estados Unidos da América. O astuto membro da tribo dos Savanas estava ao lado destes últimos e juntamente com o voluntarioso mas desajeitado cavaleiro Humberto-da-Massa-Folhada, viveria uma mão-cheia de aventuras, parodiando hábitos e costumes e os estereótipos sobre os “selvagens”.
Apenas uma mão-cheia porque, entretanto, Astérix tinha nascido, em 1959, juntamente com a revista “Pilote”, e o grande sucesso de ambos – bem como o muito trabalho que davam – levou ao abandono da série, depois adaptada em versão áudio e em desenhos animados, que tem sido alvo de sucessivas reedições ao longo destes 50 anos.
Em Portugal, Humpá-Pá estreou-se no “Zorro” (1963), tendo passado também pela versão nacional da revista “Tintin”, e foi sucessivamente editado em álbum pela Íbis, Bertrand e Meribérica/Líber. A ASA tem em curso mais uma reedição integral, cujo primeiro volume, “Humpá-Pá, o pele-vermelha” (2005), inclui as tiras originais de 1951, devendo o segundo (dos três previstos) ser lançado em Maio próximo.


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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30 anos sem Goscinny

Criador de Astérix foi um dos mais notáveis argumentistas de banda desenhada; Biografia e livro de crónicas assinalam a data em França; revista “Lire” consagra-lhe um número especial

Foi há 30 anos, a 5 de Novembro de 1977, que a banda desenhada – e a literatura – perderam René Goscinny, um dos seus mais notáveis escritores, vítima de um ataque cardíaco enquanto fazia um teste de esforço numa clínica… Para a posteridade – e gáudio de milhões de leitores de várias gerações, deixou personagens inolvidáveis, entre as quaisAstérix, João Pistolão e Humpá-pá (com Uderzo), Lucky Luke (Morris), Iznogoud (Tabary) ou o menino Nicolau (Sempé).
Nascido a 14 de Agosto de 1926, em Paris, para além de ser um notável humorista e um dos escritores de língua francesa mais traduzidos e lidos no mundo inteiro, Goscinny foi também percursor na defesa dos direitos dos autores de BD e um grande descobridor de talentos, nomeadamente enquanto chefe de redacção da revista “Pilote”, um dos mais importantes títulos periódicos da história da BD europeia, que contribuiu para a revolucionar e a levar a atingir também um público adulto, em cujo número inicial Astérix nasceu (a 29 de Outubro de 1959), e onde revelou autores como Bretécher, Cabu, Christin, Druillet, Fred, Meziéres, Mandryka, Reiser ou Solé. Porque Goscinny foi sempre capaz de reconhecer uma boa BD e de incentivar e lançar os seus autores, mesmo quando as temáticas ou estilos apresentados não eram os que mais lhe agradavam.
No ano em que Angoulême, França, deu, em Janeiro, o seu nome a uma das suas artérias, os 30 anos sobre a sua morte são assinalados por três publicações. A primeira, “Du Panthéon à Buenos Aires – Chroniques illustrées” (Imav Éditions), recolhe dezasseis crónicas escritas por Goscinny, os “bilhetes de humor”, como ele gostava de lhes chamar, abordando os pequenos defeitos do género humano, agora ilustradas, em jeito de homenagem, entre outros, por Gotlib, Mézières, Giraud e Tibet.
Já “Goscinny – La liberté d’en rire” (Ed. Perrin), é, segundo o seu autor, o historiador Pascal Ory, “a aventura do mais famoso argumentista cómico de toda a história da banda desenhada francófona, ao lado do mais notável patrão de toda a história das publicações para os jovens”.
Finalmente, a conceituada revista literária “Lire”, consagra-lhe um dos seus raros números especiais, intitulado “La vie secrète de Goscinny”, que inclui inéditos de Goscinny, entre os quais uma história do menino Nicolau, homenagens de escritores e desenhadores como Uderzo, Didier van Cauwelaert, Daniel Pennac, Serge Tisseron, Umberto Eco, Moebius ou Bilal, e em cujo editorial se lê: “René Goscinny é um dos génios do século XX. Digo alto e bom som: reduzir Goscinny a um autor de BD é um erro; ele foi um dos gigantes da literatura popular. Alegrem-se: o escritor continua vivo, pois o seu universo é imperecível”.

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O corsário Pistolão
Para além de Astérix e Lucky Luke, Goscinny escreveu argumentos para inúmeras personagens (ou, mais exactamente, mais de 1400, compiladas em “Le dictionnaire Goscinny” (2003), que, nas suas 1248 páginas, analisa exaustivamente as 19 séries, 150 álbuns, 387 romanos e gauleses, 654 cowboys e índios, 309 génios e princesas, 91 javalis…), entre as quais “Luc Junior” (1953) e “Humpá-pá o pele-vermelha” (1958). Ou também “Jehan Pistolet” (1952) ou João Pistolão, na versão portuguesa da ASA, que acaba de lançar o segundo tomo, “Corsário do rei”.
História bem disposta de piratas e corsários, apesar de alguma ingenuidade, revela já os seus talentos de humorista, capaz de em meia dúzia de diálogos levar os leitores a um sorriso (ou às lágrimas), utilizando humor directo, a repetição de situações, indescritíveis trocadilhos ou uma equilibrada crítica social ou de costumes. E no qual Uderzo, partindo de um estilo semi-realista e terminando mais próximo do traço que o celebrizou, demonstra já um bom domínio da planificação, do ritmo e do sentido de leitura.


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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