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Novo álbum de Astérix já tem capa

Intitula-se “O íris branco” e será o 40.º álbum das aventuras de Astérix e Obélix. Está agendado para 26 de Outubro e a capa oficial acaba de ser divulgada.
Sem grandes artifícios gráficos nem muita originalidade, coloca no centro, num tapete verde, Astérix e um romano que terá um papel preponderante no desenrolar da história. No fundo, pintados em tons monocromáticos, vêem-se dois grupos de gauleses, sendo de salientar que o chefe Matasétix e a sua esposa Boapinta estão separados. Este facto ganha relevo pois durante o verão, jornais francófonos publicaram um pequeno conto em seis tiras, “Le combat du Chef” (“O combate do Chefe”), que concluía a prancha-teaser divulgada em Março, em que Astérix e Obélix aconselham o líder gaulês sobre a melhor forma de retomar uma boa relação com a esposa, subentendendo-se que o casal também terá um papel importante na aventura.
Com uma novidade a cada dois anos desde que Uderzo entregou a série aos seus continuadores, os álbuns de Astérix têm seguido um calendário quase imutável: primeiras informações em Março, divulgação da capa no início de Outubro e lançamento mundial por volta de 26 de Outubro. Este ano, a capa é conhecida mais cedo, sem informações adicionais, aparentemente devido a uma inesperada fuga, pois um exemplar do álbum esteve à venda no Vinted, um site francês de artigos em segunda mão, pela módica quantia de nove euros.
Deste quinto álbum sem os criadores dos gauleses, René Goscinny (1926-1977) e Albert Uderzo (1927-2020), sabia-se já que a grande novidade era a substituição do argumentista Jean-Yves Ferry por Fabrice Caro, mantendo-se Didier Conrad como responsável pelo desenho.
Aventura caseira depois da ida às estepes russas em “Astérix e o Grifo”, “O Íris Branco” tem por base o aparecimento de uma nova escola de pensamento positivo, vinda de Roma, que irá influenciar os habitantes da aldeia, provocando dissensões e perturbando o seu equilíbrio.
O álbum terá uma tiragem global de 5 milhões de exemplares, nos quais está contabilizada a edição portuguesa das Edições ASA, que chegará às livrarias nacionais no mesmo dia em que a francófona será posta à venda.


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F. Cleto e Pina

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Elizabeth Taylor nos Quadradinhos

Diva do cinema, Elizabeth Taylor teve passagem fugaz pela banda desenhada, incluindo uma biografia na colecção “Mujeres Celebres”, embora tenha ficado imortalizada como uma das mais conhecidas personagens femininas de Astérix, a rainha Cleópatra, a quem serviu – involuntariamente – de modelo. Aliás, mais tarde, Goscinny et Uderzo revelaram que a ideia para o livro, cuja capa original de 1965 é decalcada do cartaz do filme de Mankiewicz, surgiu exactamente após o visionamento da película, durante o qual se fartaram de rir. De Elizabeth Taylor, a Cleópatra de Astérix não herdou apenas o visual (incluindo “o nariz muito bonito”!), mas também os modos da actriz.

O sucesso da Cleópatra do celulóide deu origem a uma adaptação do filme aos quadradinhos, feita na Argentina por autores desconhecidos, e a colagens ao tema mais ou menos evidentes, nos meses seguintes, em histórias aos quadradinhos como “Archie’s girl Betty and Veronica”, “Iron man”, “Superman” ou “Wonder Woman”.

Curiosamente, seria na BD que Elizabeth Taylor, casada sete vezes, encontraria o homem dos seus sonhos, Herbie Popnecker, uma criação de Shane O’Shea e Ogden Whitney, em 1958, que foi estrela da revista “Forbidden Worlds”. Feio, baixo e gordo, Herbie, que podia voar, tornar-se invisível ou falar com animais, entre muitos outros poderes que obtinha lambendo um chupa-chupa mágico, conquistou o coração da actriz na edição #116, mas deixou-a a suspirar, como ela fez a muitos homens ao longo da vida.

Elizabeth Taylor
Vogue France.

A história de… Astérix, o pequeno guerreiro gaulês

Não é muito alto, mas compensa a baixa estatura com a sua sagacidade… e com a poção mágica que lhe confere força sobre-humana, cujo segredo apenas o druida Panoramix conhece.

Rezam as crónicas (em banda desenhada) que Astérix nasceu em 85 a. C., enquanto decorria (mais) uma zaragata na sua aldeia, algo completamente normal, refira-se. Diz-se que os seus pais foram dois franceses, René Goscinny e Albert Uderzo, mas na realidade os seus progenitores chamam-se Bomboca e Astronomix. Actualmente habitam em Condate, onde gerem uma loja de artesanato gaulês, chamada “O Menir Voador”, mas quando Astérix nasceu, viviam onde ele ainda mora, numa pequena aldeia no norte da Gália, povoada por irredutíveis gauleses que resiste ainda e sempre ao invasor romano…
Celibatário até hoje, conhecem-se-lhe apenas duas paixonetas sem consequências: a gaulesa Falbala e a romana Latraviata. Apesar disso, quando lhe deixaram uma criança à porta, todos suspeitaram de um caso amoroso, mas veio a descobrir-se que o bebé era filho da rainha Cleópatra (que tinha um belo nariz).
Goscinny e Uderzo, na realidade, limitaram-se a fazer a crónica (aos quadradinhos) das suas muitas e bem divertidas aventuras, nas quais por diversas vezes exasperou o imperador Júlio César e distribuiu prazenteira e generosamente tabefes por quase todos os legionários romanos com quem se cruzou. Nelas, percorreu praticamente todo o mundo antigo conhecido, desde a sua Gália natal (à qual deu a primeira volta… a pé!), a países próximos, como a Hispânia, Germânia (o país dos godos), Normandia, Bretanha ou Helvécia, ou mais distantes, como o Egipto, a América, a Índia ou a Numídia. Em Roma, onde todos os caminhos vão dar, participou nos célebres jogos de circo no Coliseu, e em Atenas, conquistou uma coroa de louros nos Jogos Olímpicos.
Sem profissão definida, a tudo isto prefere o sossego da sua aldeia natal – apesar de até extraterrestres já lá terem aparecido – ou ir à floresta caçar javalis com o seu amigo e companheiro de aventuras Obélix, nascido no mesmo dia que ele, o tal que caiu na poção mágica quando era pequeno.
E hoje, tantos anos depois, continua a ter medo apenas de uma coisa: que o céu lhe caia em cima da cabeça! Mas, felizmente, como é uso dizer-se na sua aldeia: “Amanhã não será a véspera desse dia”!


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F. Cleto e Pina

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Parabéns Astérix!

Há exactamente 50 anos, a 29 de Outubro de 1959, surgia nas bancas francesas a revista “Pilote”. Nela, fazia a sua estreia um certo Astérix, que viria a tornar-se um dos mais conhecidos e apreciados heróis de banda desenhada de sempre.

À partida, nada o parecia indicar. O titular da série era baixo, pouco vistoso e mais astuto que inteligente. Ao seu lado, caminhava um gigante desajeitado, sempre com um menir – um calhau! – às costas, incapaz de controlar a sua força excessiva. Na sua aldeia, habitavam um chefe com pouca autoridade, um peixeiro com horror a peixe fresco, um bardo com voz de cana rachada, um ferreiro que usava o martelo mais para bater neste último do que para trabalhar na forja e diversos outros exemplos a não seguir. A isto há que acrescentar que todos tinham nomes acabados em “ix” e que sistematicamente andavam à pancada entre si, excepto quando se entretinham a bater nos romanos entrincheirados nos campos fortificados que rodeavam a sua aldeia.
E a tiragem do primeiro álbum – Astérix o Gaulês (1961) – de apenas 6 mil exemplares, parecia confirmá-lo. No entanto, a sucessão de novas aventuras, o apuramento gráfico de Uderzo, um desenhador de eleição, com as suas personagens arredondadas e de nariz grande e um notável sentido de ritmo e de movimento, e o humor inteligente e irresistível de Goscinny, pouco a pouco foram conquistando leitores, fazendo com “Astérix e Cleópatra” (1965) já tirasse 100 mil exemplares, e dois anos depois, “Astérix e os Normandos” ultrapassasse o milhão de exemplares.
As bases do sucesso foram os vários níveis de leitura presentes na obra, cativante para os mais novos pelas sucessivas tareias que os gauleses davam nos romanos, e para os mais velhos, pela mordaz crítica social e de costumes, pelo divertido retrato estereotipado que Goscinny traçou de cada um dos povos dos países que Astérix visitou, logo a começar pelos franceses, pela abordagem de temáticas sempre (e ainda!) actuais, pelos bem conseguidos trocadilhos e pela repetição de situações, aparentemente sempre iguais mas com desfechos sempre diferentes, como os sucessivos confrontos com os piratas ou o hábito de Obélix coleccionar capacetes de legionários.
Quando Goscinny faleceu em 1977, muitos pensaram que tinha chegado o fim do pequeno guerreiro gaulês, mas após um período de reflexão, Uderzo decidiu assumir integralmente a criação de Astérix e, se a qualidade dos argumentos se ressentiu disso, o hábil gestor que ele se revelou, multiplicando os produtos de merchandising, criando um parque temático e apostando no audiovisual, onde se contam sete filmes de animação e três longas-metragens com actores como Christian Clavier, Gérard Deperdieu, Roberto Benigni, Laetitia Casta ou Mónica Bellucci, fez com que as vendas disparassem – a tiragem global de “O céu cai-lhe em cima da cabeça” (2005) foi de 8 milhões – transformando Astérix numa marca apetecida que gera mais de 12 milhões de euros anuais. E que continuará após a sua morte, como decidiu no inicio deste ano quando vendeu os direitos da série à Hachette, com o beneplácito de Anne Goscinny, filha do argumentista, mas com a oposição da sua própria filha, Sylvie, detentora de 40 % das Éditions Albert-René, que levou o caso para os tribunais.
Mas isso, são outras histórias. As que interessam hoje, são aos quadradinhos: 35 álbuns, mais de 1500 pranchas, que esta data convida a (re)ler e (re)descobrir, com a garantia de boas gargalhadas, momentos bem passados e um alegre banquete final, com javali assado e sem a voz do bardo a desafinar.

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Em Portugal

Astérix estreou-se em Portugal a 4 de Maio de 1961, a preto e branco, no nº 1 da revista Foguetão, dirigida por Adolfo Simões Muller que já tinha estreado Tintin entre nós. O herói gaulês passou também pelas páginas do “Cavaleiro Andante” e do “Zorro”, antes de se fixar na “Tintin”, em 1968. Um ano antes, a Bertrand editara o seu primeiro álbum em português.

Nomes em português

A entrada de Astérix no catálogo da ASA, em 2005, ficou marcada por uma nova tradução que apresentava como principal novidade o facto de as personagens, com excepção de Astérix, Obélix e Panoramix, terem passado a ter nomes “portugueses”: Idéfix passou a Ideiafix, o chefe Abraracourcix foi rebaptizado de Matasétix, a sua mulher Bonemine como Boapinta, o bardo Assurancetourix como Cacofonix e o velho Agecanonix tornou-se Decanonix.

Em mirandês

Entre as 107 línguas e dialectos em que Astérix está traduzido conta-se o mirandês, com dois álbuns: Astérix L Gaulês e L Galáton (Astérix o gaulês e O Grande Fosso).

Personalidades

Ao folhear os álbuns de Astérix é possível encontrar caricaturas de René Goscinny, os Dupont, Jacques Chirac, Sean Connery, Kirk Douglas, Arnold Schwarzenegger, os Beatles ou Eddy Merckx.

Sucessores

Em meados de Outubro Uderzo anunciou os seus sucessores, Régis Grébent e os irmãos Frédéric e Thierry Mébarki, que trabalham com ele há alguns anos no desenho de merchandising e material publicitário e que já colaboraram no mais recente álbum.

Comemorações

Se o ponto alto das comemorações dos 50 anos de Astérix e Obélix foi o lançamento do novo álbum, muitas outras manifestações assinalam a data, entre as quais um enorme Astérix desenhado no céu pela célebre esquadrilha da Patrouille de France.
No passado dia 22 foi levado à cena o espectáculo musical “Le Tour de Gaule Musical d’Astérix”, estão patentes exposições alusivas no Museu de Cluny, em Paris (até 3 de Janeiro de 2010) e no Festival Quais des Bulles (até 15 de Novembro) e hoje os irredutíveis gauleses invadirão (pacificamente) Lutécia, que é como quem diz Paris. E m Dezembro, os correios franceses emitem um bloco com selos com Astérix.
Por cá, a Embaixada de França e as Edições ASA promovem hoje, às 19h, um cocktail, durante o qual Júlio Isidro apresentará o novo álbum, e o Amadora BD 2009 tem patente até 8 de Novembro uma exposição de objectos de colecção relacionados com Astérix.

No espaço

Em 1965, o primeiro satélite espacial francês foi baptizado… Astérix.

Vendas

Astérix vendeu cerca de 400 milhões de álbuns em todo o mundo, dos quais 2 500 000 em Portugal.

Um português em Astérix

Em O Domínio dos Deuses (1971), entre os escravos dos romanos, vêem-se cinco portugueses, designados por iberos ou lusitanos, os únicos especificamente citados na série; apesar da sua situação, um deles não deixa de revelar a sua (nossa) veia poética!


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F. Cleto e Pina

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Humpá-Pá completa meio século

Criação de Goscinny e Uderzo é anterior a Astérix; Reedição portuguesa prossegue em Maio

Completam-se hoje 50 anos sobre a estreia de Humpá-Pá, o pele-vermelha, na revista “Tintin” belga, possivelmente a mais bem sucedida criação conjunta de René Goscinny e Albert Uderzo, a seguir a Astérix, claro está.
Mas poderiam ser 57 anos, pois os primeiros esboços do herói datam de 1951. Com Goscinny recém-chegado dos Estados Unidos, o fascínio pelo velho oeste era evidente, mas a abordagem humorística, no formato tiras de imprensa, não surtiu os efeitos desejados e Oumpah-pah (no original) teve que passar mais alguns anos na gaveta das (geniais) ideias de Goscinny.
Quando renasceu, tinha sofrido alterações de monta. Primeiro, adoptava o formato tradicional da BD franco-belga, depois, o grafismo de Uderzo tinha-se depurado e era mais solto, de traço arredondado, bem dotado de sentido de movimento, legível, expressivo… Finalmente, Goscinny, já espraiava a sua ironia fina e o seu sentido de humor apurado, revelado quer graficamente, quer nos jogos de linguagem, que viria a mostrar-se em todo o esplendor em Astérix.
Humpá-Pá, nesta nova existência, recuava para o século XVIII, em pleno conflito entre (índios,) britânicos e franceses pela posse do território dos futuros Estados Unidos da América. O astuto membro da tribo dos Savanas estava ao lado destes últimos e juntamente com o voluntarioso mas desajeitado cavaleiro Humberto-da-Massa-Folhada, viveria uma mão-cheia de aventuras, parodiando hábitos e costumes e os estereótipos sobre os “selvagens”.
Apenas uma mão-cheia porque, entretanto, Astérix tinha nascido, em 1959, juntamente com a revista “Pilote”, e o grande sucesso de ambos – bem como o muito trabalho que davam – levou ao abandono da série, depois adaptada em versão áudio e em desenhos animados, que tem sido alvo de sucessivas reedições ao longo destes 50 anos.
Em Portugal, Humpá-Pá estreou-se no “Zorro” (1963), tendo passado também pela versão nacional da revista “Tintin”, e foi sucessivamente editado em álbum pela Íbis, Bertrand e Meribérica/Líber. A ASA tem em curso mais uma reedição integral, cujo primeiro volume, “Humpá-Pá, o pele-vermelha” (2005), inclui as tiras originais de 1951, devendo o segundo (dos três previstos) ser lançado em Maio próximo.


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F. Cleto e Pina

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30 anos sem Goscinny

Criador de Astérix foi um dos mais notáveis argumentistas de banda desenhada; Biografia e livro de crónicas assinalam a data em França; revista “Lire” consagra-lhe um número especial

Foi há 30 anos, a 5 de Novembro de 1977, que a banda desenhada – e a literatura – perderam René Goscinny, um dos seus mais notáveis escritores, vítima de um ataque cardíaco enquanto fazia um teste de esforço numa clínica… Para a posteridade – e gáudio de milhões de leitores de várias gerações, deixou personagens inolvidáveis, entre as quaisAstérix, João Pistolão e Humpá-pá (com Uderzo), Lucky Luke (Morris), Iznogoud (Tabary) ou o menino Nicolau (Sempé).
Nascido a 14 de Agosto de 1926, em Paris, para além de ser um notável humorista e um dos escritores de língua francesa mais traduzidos e lidos no mundo inteiro, Goscinny foi também percursor na defesa dos direitos dos autores de BD e um grande descobridor de talentos, nomeadamente enquanto chefe de redacção da revista “Pilote”, um dos mais importantes títulos periódicos da história da BD europeia, que contribuiu para a revolucionar e a levar a atingir também um público adulto, em cujo número inicial Astérix nasceu (a 29 de Outubro de 1959), e onde revelou autores como Bretécher, Cabu, Christin, Druillet, Fred, Meziéres, Mandryka, Reiser ou Solé. Porque Goscinny foi sempre capaz de reconhecer uma boa BD e de incentivar e lançar os seus autores, mesmo quando as temáticas ou estilos apresentados não eram os que mais lhe agradavam.
No ano em que Angoulême, França, deu, em Janeiro, o seu nome a uma das suas artérias, os 30 anos sobre a sua morte são assinalados por três publicações. A primeira, “Du Panthéon à Buenos Aires – Chroniques illustrées” (Imav Éditions), recolhe dezasseis crónicas escritas por Goscinny, os “bilhetes de humor”, como ele gostava de lhes chamar, abordando os pequenos defeitos do género humano, agora ilustradas, em jeito de homenagem, entre outros, por Gotlib, Mézières, Giraud e Tibet.
Já “Goscinny – La liberté d’en rire” (Ed. Perrin), é, segundo o seu autor, o historiador Pascal Ory, “a aventura do mais famoso argumentista cómico de toda a história da banda desenhada francófona, ao lado do mais notável patrão de toda a história das publicações para os jovens”.
Finalmente, a conceituada revista literária “Lire”, consagra-lhe um dos seus raros números especiais, intitulado “La vie secrète de Goscinny”, que inclui inéditos de Goscinny, entre os quais uma história do menino Nicolau, homenagens de escritores e desenhadores como Uderzo, Didier van Cauwelaert, Daniel Pennac, Serge Tisseron, Umberto Eco, Moebius ou Bilal, e em cujo editorial se lê: “René Goscinny é um dos génios do século XX. Digo alto e bom som: reduzir Goscinny a um autor de BD é um erro; ele foi um dos gigantes da literatura popular. Alegrem-se: o escritor continua vivo, pois o seu universo é imperecível”.

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O corsário Pistolão
Para além de Astérix e Lucky Luke, Goscinny escreveu argumentos para inúmeras personagens (ou, mais exactamente, mais de 1400, compiladas em “Le dictionnaire Goscinny” (2003), que, nas suas 1248 páginas, analisa exaustivamente as 19 séries, 150 álbuns, 387 romanos e gauleses, 654 cowboys e índios, 309 génios e princesas, 91 javalis…), entre as quais “Luc Junior” (1953) e “Humpá-pá o pele-vermelha” (1958). Ou também “Jehan Pistolet” (1952) ou João Pistolão, na versão portuguesa da ASA, que acaba de lançar o segundo tomo, “Corsário do rei”.
História bem disposta de piratas e corsários, apesar de alguma ingenuidade, revela já os seus talentos de humorista, capaz de em meia dúzia de diálogos levar os leitores a um sorriso (ou às lágrimas), utilizando humor directo, a repetição de situações, indescritíveis trocadilhos ou uma equilibrada crítica social ou de costumes. E no qual Uderzo, partindo de um estilo semi-realista e terminando mais próximo do traço que o celebrizou, demonstra já um bom domínio da planificação, do ritmo e do sentido de leitura.


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F. Cleto e Pina

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O bom, velho Astérix

Astérix Legionário
Astérix na Córsega
Obélix e Companhia
René Goscinny (argumento) e Albert Uderzo (desenho)
Edições ASA
12,00€

Continuando a reedição dos álbuns de Astérix, integrada na comemoração dos seus 45 anos (em Outubro de 2004), com novas traduções, a ASA acaba de lançar meia dúzia de títulos entre os quais três dos melhores álbuns da série – “Astérix Legionário” (1967), “Astérix na Córsega” (1973) e “Obélix e Companhia” (1976) -, se tal distinção é permitida, sendo os restantes “O Domínio dos Deuses” (1971), “Os Louros de César” (1972) e “O Presente de César” (1974). A nova tradução, com defeitos e qualidades em relação à anterior, e a que se pode apontar como aspectos mais negativos o uso de expressões anacrónicas (“vira o disco e toca o mesmo”) ou de nomes associados a regionalismos… lisboetas (Transtejix), destaca-se pelo facto de todos, com excepção de Astérix, Obélix e Panoramix, terem novos nomes, aportuguesados.
Quanto à reedição em si, tem a vantagem de poder levar muitos a reencontrar o bom, velho Astérix, que tão maltratado tem sido nos álbuns que Uderzo assinou a solo, e outros a redescobri-lo em toda a sua pujança.
Isto porque basta uma leitura superficial pode fazer sorrir (pelo menos…) com as situações recorrentes – a pancada que os gauleses distribuem aos romanos, o hábito de Obélix coleccionar capacetes de legionários, a razia (anti-ecológica…!) que os gauleses provocam nos javalis, os constantes desaires dos piratas ou as desavenças entre o peixeiro Ordemalfabétix e o ferreiro Éautomatix – resolvidas sempre de forma diferente mas sempre hilariante.
Mas é uma leitura mais atenta (e também mais culta…) que permite desfrutar em pleno de uma das melhores séries humorísticas de todos os tempos e não me refiro apenas à banda desenhada. Isto porque René Goscinny, numa demonstração de um sentido de humor ímpar e de uma bagagem cultural invejável, aproveitou-a para fazer crítica social e de costumes, satirizar pessoas, regiões, países e povos, de uma forma que resiste perfeitamente ao passar dos anos, abordando aspectos como a ecologia, a imobiliária, a organização política e militar, o relacionamento inter-pessoal, a própria realidade histórica ou brincando até com as convenções da própria linguagem da BD.
Assim, “Astérix Legionário” é uma sátira brilhante e arrasadora à instituição militar, desmontando e ridicularizando os seus formalismos, burocracias, métodos de treino e tácticas de combate, quando Astérix e Obélix se alistam para libertar um amigo feito voluntário à força em tempo de guerra civil.
Já “Obélix e Companhia” é uma incursão pelo intrigante mundo dos negócios, quase um tratado de economia em menos de meia centena de páginas que exemplificam magistralmente conceitos como oferta e procura, desvalorização da moeda ou falência.
Finalmente, “Astérix na Córsega”, traça um retrato irresistível de um povo (muito) “susceptível”, incapaz de esquecer e perdoar, ciente dos seus valores e tradições e dos seus queijos de cheiro nauseabundo. E este álbum, mais do que qualquer um deste lote, destaca-se por mostrar um Uderzo em plena posse das suas (muitas e inexcedíveis) faculdades gráficas, combinando o tom caricatural da série com o tratamento semi-realista aplicado aos corsos e à pujante representação da sua ilha, e combinando o seu traço suave, vivo e dinâmico com o bom domínio da planificação, do ritmo e do sentido de leitura


Escrito Por

F. Cleto e Pina

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