Os autores Álvaro e Dearradé são os protagonistas
Reflexão sobre a importância do humor, centrada na realidade da BD nacional
Na banda desenhada – como nos perfumes, os chocolates… – o tamanho não tem importância. Que é como quem diz, a qualidade de uma obra não se afere pelo seu número de páginas, mas sim pelo que ela conta e/ou pelo modo como o conta.
Vem este intróito a propósito de “Há quem queira que a luz se apague”, uma singela edição da Kingpin Books com apenas 16 páginas, escrita por Mário de Freitas, desenhada por Derradé e com cores de Beatriz Duarte, que reflete sobre a importância do humor, tendo por base dois autores nacionais, raros exemplos de cultores do género na BD portuguesa contemporânea.
São eles Derradé – criador de “A loja” (editada pela Polvo) ou “O fogo sagrado” (Escorpião Azul) – e Álvaro – “Conversas com os putos” ou “Porra… voltei!”, em auto-edições com a chancela Insónia – que surgem agora também como protagonistas deste opúsculo, envelhecidos e com limitações físicas.
Surgindo de alguma forma na esteira de “O fogo sagrado”, uma reflexão pós-apocalíptica sobre a imperatividade íntima do seu autor, Derradé, se dedicar à banda desenhada, “Há quem queira que a luz se apague”, que se auto-define como “uma visão apocalíptica-realista de um mundo que não se avizinha para graças”, também surge ambientada num futuro indefinido, que assustadoramente não parece muito distante, em que os praticantes do humor estão a ser detidos e reprogramados, sob a égide de um desconhecido “Supremo Líder”. O último “terrorista do humor ainda a monte” é Derradé que, uma vez capturado, vai ser confrontado com uma chocante revelação.
Embora “Há quem queira que a luz se apague” esteja de algum modo centrada na realidade da BD nacional, podendo por isso ser melhor fruída por quem a conhece e/ou frequenta, a verdade é que a reflexão que suscita sobre a possibilidade de rir e fazer rir e sobre olhar crítico que isso implica, é facilmente aplicável a qualquer outro meio ou forma de expressão, num tempo em que, infelizmente, cada vez mais o humor, o pensamento inteligente e o sentido crítico são postos em causa continuamente pelo enjoativo politicamente correcto que domina crescentemente e tenta nivelar por baixo, fazendo prevalecer a estupidez e a imbecilidade.
Há quem queira que a luz se apague
Mário Freitas, Derradé e Beatriz Duarte
Kingpin Books
16 p., 6,50€
Escrito Por
F. Cleto e Pina
Publicação
Jornal de Notícias