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Rip Kirby em Português

Depois do “Principe Valente”, de Hal Foster e do “Tarzan” de Russ Manning, a editora Bonecos Rebeldes recupera mais um clássico da Banda Desenhada norte-americana publicada nos jornais: a série “Rip Kirby”, de Alex Raymond. Último trabalho de Raymond, falecido em 1956, num acidente de viação, “Rip Kirby” é a segunda incursão do criador de “Flash Gordon” e de “Jungle Jim”, pelo registo policial, depois de no início de carreira ter desenhado a série “Secret Agent X-9”, a partir de um argumento do escritor Dashiel Hammet.
“Rip Kirby” assinala o regresso de Raymond à Banda Desenhada depois de um período de 22 meses em que esteve alistado no exército americano. Terminada a II Guerra Mundial, Raymond regressou disposto a retomar a série “Flash Gordon”, que tinha ficado a cargo do seu assistente Austin Briggs, mas como a King Features entretanto tinha assinado um contrato com Briggs para desenhar a série até 1948, Raymond viu-se obrigado a criar um novo personagem, um detective cheio de glamour chamado Rip Kirby, que traduzia uma abordagem mais madura às histórias policiais.

Ao contrário de “Flash Gordon” e Jungle Jim”, que saiam a cores nas páginas dominicais dos jornais, “Rip Kirby” foi pensado desde o início para ser publicado a preto e branco, como tira diária, o que permitiu a Raymond trabalhar o seu estilo de um modo diferente. Sem o espaço para as composições barrocas da fase final de Flash Gordon, optou por jogar com as sombras, como ainda não tinha feito em trabalhos anteriores. Mas o que marca mais este trabalho é a elegância do traço de Raymond e a extraordinária sensualidade e glamour das mulheres que desenha, desde Honey Dorian, a eterna namorada de Kirby, até Pagan Lee, a sedutora e mortífera “má da fita”, cujo visual serviu de inspiração para Bettie Page, que vai ser uma presença recorrente ao longo da série.
Este primeiro volume, de uma edição prevista para 13 volumes, recolhe em 56 páginas que recolhem em média 4 tiras por página, as três primeiras aventuras de Rip Kirby, publicadas entre Março e Novembro de 1946, precisamente no mesmo formato em que a editora está a editar o “Príncipe Valente”.

E, embora o trabalho de Catherine Labey, que faz a tradução e execução gráfica, não atinja a perfeição a que Manuel Caldas nos foi habituando noutras reedições de clássicos, e a legendagem e o colorido em photoshop da capa não serem nada famosos, esta edição da Bonecos Rebeldes tem os seus méritos, não sendo tão má como alguns têm escrito, mesmo que o preço de 25€ por um livro de 56 páginas custe a dar, sobretudo tendo em conta que a edição do “Príncipe Valente da mesma editora, tem quase o dobro das páginas por volume e custa apenas mais 2,50€… É que é muito importante não esquecer que a edição da Bonecos Rebeldes é, de todas as disponíveis no mercado, a única que reproduz na sua totalidade as tiras de Raymond.
Para poder jogar com as questões de espaço nos diferentes jornais que publicavam a série, a King Features disponibilizava duas versões diferentes de cada tira, uma integral e outra ligeiramente mais curta, com o desenho amputado em alguns milímetros. É essa versão cortada que foi usada para a maioria das edições, incluindo a luxuosa edição em 4 volumes que a IDW está a publicar nos EUA, (de onde tirei a maioria das ilustrações para este artigo) que também não reproduz as tiras desenhadas por Raymond na totalidade, cortando a parte de baixo de cada imagem. Imagens que a edição da Bonecos Rebeldes reproduz na íntegra, como facilmente podem ver pelos exemplos que a seguir mostro.

(“Rip Kirby”, Vol. 1, de Alex Raymond, Bonecos Rebeldes, 56 pags, 25,00€)

Rip Kirby

“É visível o prazer que tive em desenhá-lo”

Afirma Colin Wilson, desenhador de Major Alvega, que hoje regressa às livrarias portuguesas, e também de Blueberry e Tex; “É mais fácil desenhar aviões do que cavalos”, revela o autor; História comemorativa dos 50 anos do herói chega com dois anos de atraso

Começa hoje a ser distribuído nas livrarias portuguesas o livro “Battler Britton /Major Alvega” (BDMania), que há dois anos assinalou os 50 anos da criação daquele que foi, possivelmente, o mais popular herói dos quadradinhos da Segunda Grande Guerra em Portugal, apesar da sua origem inglesa (ver caixa).
Esta nova aventura, decorre em Outubro de 1942, numa altura em que os alemães pareciam imparáveis nos seus avanços. Neste contexto, o ás da aviação da RAF (Royal Air Force, a Força Aérea britânica), é enviado para uma base americana no Norte de África, para preparar um ataque conjunto às forças de Hitler, tendo que enfrentar, para além dos perigos habituais, a zombaria dos pilotos americanos.
Originalmente editada pela Wildstorm, um dos selos da DC Comics, como uma mini-série de cinco números, tem capas de Garry Leach e a assinatura do britânico Garth Ennis, reputado argumentista de “Preacher”, “Hitman” ou “Judge Dread”, e do neo-zelandês Colin Wilson, que os portugueses conhecem como desenhador de “A Juventude de Blueberry” e de “O último rebelde”, um Tex gigante da Mythos.
Sobre este trabalho o artista, de 58 anos, afirmou ao JN ser “muito diferente dos meus westerns”, esperando que “tal como Blueberry e Tex, seja uma boa aventura, que por acaso decorre durante a Segunda Guerra Mundial”. Tendo dificuldades em comparar “o trabalho envolvido nestes dois géneros”, reconhece que continua a “achar muito mais fácil desenhar aviões do que cavalos”!
O trabalho nesta mini-série permitiu-lhe o reencontro com um dos heróis da sua juventude, já que era “um grande fã dos pequenos formatos sobre a Segunda Guerra Mundial, publicados na Grã-Bretanha pela Fleetway, em especial das histórias com aviões, muitas delas de Battler Britton”. Entre elas destaca as “desenhadas pelo britânico Ian Kennedy”, por isso, “imediatamente aceitei desenhar a história e senti-me honrado por seguir as pisadas deste grande artista” que, soube mais tarde, “tinha sido a primeira escolha para desenhar o regresso de Battler, tendo recusado por estar retirado“. E revela “quando o Garth Ennis e eu discutimos o projecto, concordámos logo em torná-lo uma homenagem à sua maravilhosa arte”.
Não se reconhecendo no herói – “Battler é íntegro, indomável e invencível, portanto impossível de tomar como modelo” – afirma que “o maior desafio desta BD foi representar os aspectos técnicos de uma forma visualmente convincente e correcta. Especialmente os voos dos aviões, algo que eu já desejava há anos. Felizmente o Garth é especialista na matéria e ajudou-me muito nos detalhes de uniformes, equipamentos e aviões. Acho que é visível no resultado final o prazer que tive no seu desenho”.
Em relação ao original, criado há mais de meio século, Wilson acredita que “a grande diferença é que o Garth e eu pudemos trabalhá-lo juntos. Nos anos 50 e 60, na Fleetway, em que os autores nem sequer eram creditados, duvido que alguns autores sequer se conhecessem. Eu e o Garth pudemos sentar-nos e conversar demoradamente sobre a aproximação que queríamos fazer ao herói. Acho que essa consistência se nota na história”.
História que foi “bastante bem recebida pelos leitores; fiquei surpreendido como tantos ainda recordavam e gostavam das histórias originais”.

[Caixa]

Inglês ou português?

Criado em 1956, na revista Sun, por Mike Butterworth (argumento) e Geoff Campion (desenho), como “Battler Britton – England’s Fighting Ace of Land, Sea and Air”, o ás da aviação inglesa, que foi também desenhado por Pratt, Ortiz, Battaglia ou Gino D’Antonnio, para a Fleetway, chegaria a Portugal no início dos anos 60, nas minúsculas páginas de “O Falcão”. Por “indicação da censura”, foi rebaptizado por Mário do Rosário, director da revista, e por Anthímio de Azevedo, o tradutor, passando a chamar-se Jaime Eduardo de Cook e Alvega, com pai ribatejano, mãe inglesa, estudos em Coimbra e patente de major em vez do original tenente-coronel!
Era a forma do Estado Novo criar bons exemplos “bem portugueses”, que também mudou o nome a outros heróis dos quadradinhos: Rip Kirby foi Rúben Quirino, Flash Gordon, Capitão Raio ou Relâmpago, o pugilista Big Ben Bolt tornou-se o campeão luso Luís Euripo e o ás do volante Michel Vaillant chamou-se Miguel Gusmão. E que também retocou decotes e saias curtas – ou simplesmente os escondeu com borrões de tinta – e apagou muitas armas, deixando heróis e bandidos a disparar com os dedos!


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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