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A Lua em (todos os) quadradinhos

Musa inspiradora de poetas e escritores, pintores e escultores, a Lua também não deixou indiferente os criadores de banda desenhada, tendo alguns enviado até lá os seus heróis de papel.
O mais célebre de todos os astronautas da banda desenhada é, com certeza, Tintin que por lá andou quase 20 anos antes de Neil Armstrong, no diptíco “Rumo à Lua”/”Explorando a Lua” começado a publicar a 30 de Março de 1950. Partindo da imaginária Sildávia, num foguetão concebido pelo Professor Tournesol, numa viagem com imensas semelhanças com aquela que a NASA organizou em 1969, Tintin, Haddock, Milu e os Dupont foram até ao satélite da Terra numa aventura que, se se enquadra no tom aventuroso normal da série, é também bastante plausível do ponto de vista científico, graças à profunda investigação que Hergé levou a cabo antes de a iniciar. Mais tarde, o autor voltaria ao tema, narrando, numa BD de apenas quatro páginas, a aventura vivida por Armstrong.
À mesma Lua, por diversas vezes, foram os heróis Disney. Numa das mais famosas, “The Loony Lunar Gold Race“, escrita pelo “homem dos patos”, Carl Barks, em 1964, Donald e Patinhas procuram lá ouro, mas Mickey e Pateta também foram astronautas mais do que uma vez, como agora, na recém-editada “Topolino e il guardiano lunare”, que assinala os 40 anos da chegada do homem à Lua. Claro está, nunca se cruzaram com o solitário Astronauta, de Maurício de Sousa, que percorre o espaço na sua nave esférica, nem com o Spirit de Will Eisner e Wally Wood, que também lá foi, em perseguição de um criminoso, no ano de 1952, em “Outer Space”. E se os heróis Disney, mais do que uma vez encontraram selenitas, no insuspeito policial Dick Tracy, criação célebre de Chester Gould, o filho do protagonista desposava uma bela… lunática. Da Lua provinha também a pedra que dava super-poderes à Moon Girl, uma super-heroína dos anos 40, criada por Max Gaines, Gradner Fox e Sheldon Moldoff, com vários pontos de contacto com a Mulher Maravilha, bem como o broche que transforma Usagi Tsukino na bela Sailor Moon, reencarnação de uma guerreira lunar e protagonista do manga a que dá título.
A adaptação do sucesso televisivo “Espaço 1999”, que teve edição portuguesa, mostrou o nosso satélite como base de naves espaciais, ideia usada em muitas outras histórias aos quadradinhos de ficção-científica, como é o caso de “Nathan Never”, um polícia que vive 200 anos no futuro, originário da Casa das Ideias Bonelli, imaginado por Medda, Serra e Vigna em 1988.
Para além disso, essa mesma Lua, onde o trapalhão Gaston Lagaffe, de Franquin, tem permanentemente a cabeça, testemunhou alguns dos banquetes de Astérix, Obélix e dos outros gauleses irredutíveis, assistiu aos oníricos passeios na cama andante do Little Nemo, de Winsor McKay, e foi companhia dos devaneios do errante Corto Maltese, de Hugo Pratt.
A terminar, duas curiosidades: em “Carson de Vénus”, que o Mundo de Aventuras publicou há cerca de um quarto de século, uma novela de Edgar Rice Burroughs, o criador de Tarzan, adaptada aos quadradinhos por Mike Kaluta, o herói, após meses de exaustivos preparativos, parte rumo a Marte, acabando por chegar a Vénus… por se ter esquecido da Lua nos seus cálculos! E dez anos antes de Armstrong descer na Lua, numa tira diária publicada no jornal inglês “Daily Express” de 21 de Novembro de 1959, Jeff Hawke, herói de ficção-científica criado por Sydney Jordan, para assinalar a sua presença no satélite terrestre, colocava uma placa na qual se lia esta previsão quase exacta: “A 4 de Agosto do ano terrestre de 1969, o primeiro ser pisou a Lua. Chamava-se Homo sapiens”!


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F. Cleto e Pina

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Gaston Lagaffe em desenho animado

Técnica inovadora vai dar vida ao herói criado por Franquin

Gaston Lagaffe, uma das mais marcantes criações da banda desenhada franco-belga, imaginada por Franquin, vai ganhar nova vida numa série de desenhos animados. O anúncio, feito pelo Syndicat des Producteurs de Films d’Animation (SPFA), dá conta do envolvimento na sua produção da Normaal Animation, da Marsu Productions e da cadeia televisiva France 3, as duas últimas já responsáveis pela passagem ao pequeno ecrã de outro herói de Franquin, o exótico Marsupilami.
Segundo o comunicado, nesta série de animação Gaston “aparecerá pela primeira vez nos ecrãs de televisão graças a uma nova técnica que permitirá animar directamente os desenhos originais do autor”, estando prevista a produção de 78 episódios de 7 minutos cada um. Este aspecto é dos que mais dúvidas tem levantado sobre a transposição de Lagaffe da 9ª arte para a TV, dado que as histórias originais, providas de um ritmo intenso e de um acentuado sentido de humor, decorriam em apenas uma ou duas pranchas. Outra das questões levantadas pelos muitos fãs de Franquin, é a questão da voz da personagem que cada leitor sempre “ouviu” de forma diferente na BD…
Integralmente editado em Portugal, Gaston Lagaffe, nasceu em 1957, no número 985 da revista “Spirou”, com aspecto ajuizado devido ao cabelo cortado curto e ao casaco e lacinho que vestia. Semanas depois, o cabelo tornou-se mais revolto e passou a vestir uns jeans, uma camisola verde de gola alta e umas alpercatas, que o acompanhariam toda a vida. Após algum tempo a vaguear (literalmente) pelas páginas da publicação, Lagaffe revelou os seus dotes de preguiçoso inveterado, uma invulgar aptidão para originar confusões e criar as mais mirabolantes (mas inúteis) invenções, desesperando os seus colegas da redacção da revista “Spirou”, cujo prédio destruiu por várias vezes. Dessa forma, André Franquin (1924-1997) fez dele um dos mais divertidos anti-heróis da BD, afirmando o seu sentido de humor transbordante e contagiante, e o seu traço pessoal, dinâmico, vivo e extremamente expressivo.


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F. Cleto e Pina

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Yvan Delporte, a morte do argumentista modesto

Foi chefe de redacção da revista Spirou e escreveu argumentos de BD para Franquin e Peyo, entre muitos outros; Foi o inventor do nome de Gaston Lagaffe

Os leitores regulares de banda desenhada franco-belga, nos anos 60, 70 e 80, encontraram muitas vezes, em notas de rodapé ou nas páginas interiores dos álbuns, a referência: “segundo uma ideia de Delporte”. Esse Delporte, cujo nome poucas vezes apareceu na capa das muitas de dezenas de álbuns que escreveu ou cujas ideias base forneceu, faleceu ontem, dia 5, devido a doença, contava 79 anos.

Nascido em Bruxelas, a 24 de Junho de 1928, Yvan Delporte deu os primeiros passos no mundo da 9ª arte em 1945, nas edições Dupuis, como “retocador” das séries norte-americanas, julgadas “muito ousadas” para a época. Quatro anos mais tarde, assinava o seu primeiro argumento, uma história de “Jean Valhardi”, para Eddy Paape, a que se seguiriam muitos mais, para Hausman, Forton, Peyo (com quem desenvolveu muitas das aventuras dos “Schtroumpfs”), Jidéhem, Roba (“Boule et Bill)”, Will (“Isabelle”), Follet, 

Bretécher e, em especial, Franquin (sendo dele muitas das ideias dos gags de Gaston Lagaffe, que comemorou 50 anos a semana passada e cujo nome se deve a Delporte que coordenou o respectivo álbum comemorativo).

Mas apesar de ter colaborado com muitos dos grandes nomes do seu tempo, Delporte ficará na história da BD principalmente como chefe de redacção da revista Spirou, entre 1955 e 1968, onde “inventou” as histórias curtas, que serviram de porta de entrada a muitos autores. Em 1977, voltaria a inovar com o irreverente suplemento “Le Trombonne Illustré”, onde deu largas ao seu humor pouco convencional, negro e cáustico, que foi uma lufada de ar fresco para a BD humorista, encaminhando-a para temas mais adultos.

Uma monografia dedicada a Delporte estava em preparação. “Agora vai ser preciso terminar o livro com a ideia que ele não o vai ler”, foi a reacção dos seus autores, Christelle e Bertrand Pissavy-Yvernault.


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F. Cleto e Pina

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50 anos de confusões

Gaston Lagaffe, o herói mais trapalhão da BD, nasceu há meio século; Parcómetros de Bruxelas desactivados hoje em sua honra: Álbum com inéditos de Franquin assinala data

Há 50 anos, nas páginas da revista “Spirou” belga, aparecia pela primeira vez uma estranha personagem, então de casaco e lacinho, sem que ninguém – nem ele próprio – soubesse muito bem porquê. Poucas semanas depois, a sua indumentária mudava para uns jeans uma camisola de gola alta e umas alpercatas, que o acompanhariam toda a vida. Após algum tempo a vaguear (literalmente) pelas páginas da publicação, Gaston Lagaffe protagonizava os seus primeiros disparates, iniciando uma longa e (justamente) celebrada carreira assente numa preguiça sem igual, numa postura física reveladora da mais entranhada moleza e numa invulgar capacidade de se ocupar com tudo e nada para deixar de lado o realmente urgente. Assim, originou um sem número de inenarráveis acidentes, invenções estrambólicas e ideias disparatadas, que fizeram a vida negra aos seus colegas da redacção da revista – com Fantásio em particular destaque – cujo edifício destruiu várias vezes e tornando-o na personagem mais calamitosa e desajeitada da histórias da banda desenhada, que fez da vida monótona num escritório uma surpresa constante. E, claro, num dos (anti)-heróis mais amados da 9ª arte, a pé ou tripulando o seu Fiat 509, inventando o ininventável ou tocando o ensurdecedor broncofone. Através dele, Franquin, por natureza introvertido e depressivo, deu largas ao seu génio, através de um humor transbordante e contagiante e de um traço personalizado, vivo, dinâmico e extremamente expressivo, muitas vezes copiado mas nunca igualado.

Várias vezes reeditado (inclusivamente em Portugal, onde começou por se chamar Jeremias…!), imortalizado numa estátua em tamanho natural no centro da Bruxelas que ele atormentou, Gaston Lagaffe vê a sua cidade natal assinalar os seus 50 anos com um mural com mais de 3 metros de altura (inaugurado ontem) e um dia sem parcómetros (hoje), em homenagem à guerra que ele sempre lhes moveu nas suas aventuras, para desespero do abnegado (e infeliz) agente da lei Longtarin.

[Caixa]

50 anos de Festa

“Festa” é uma das palavras mais adequadas para classificar o espírito de Gaston e é, por isso, o tema do álbum “Gaston 50” (Marsu Productions), coordenado por Yvan Delporte e Frédéric Jannin, que recupera histórias antigas para enumerar os diversos aspectos de uma celebração (convites, presentes, balões, flores, comida, velas, música, etc.) não sendo difícil imaginar como cada um deles se pode revelar caótico, catastrófico, inesperado ou apenas irresistivelmente divertido quando considerado sob o signo de Gaston Lagaffe.

E como cereja no topo do bolo (da festa!) o álbum inclui cerca de meia centena de tiras e ilustrações inéditas de Franquin.


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F. Cleto e Pina

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Gaston Lagaffe