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‘O que é que lhes dá gás?’

O Museu Berardo inaugurou a exposição Tinta nos Nervos que pretende fazer um retrato do panorama da banda desenhada nacional. São mais de 40 artistas representados, incluindo, o ‘pai’ desta técnica em Portugal, Rafael Bordalo Pinheiro

A exposição inclui o primeiro álbum de banda desenhada portuguesa, da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro
Não procuram fama nem dinheiro, «os autores de banda desenhada apenas querem dar azo à sua carolice!», brinca Pedro Vieira de Moura, comissário de Tinta nos Nervos uma exposição que inaugurou no passado dia 10 de Janeiro, no Museu Colecção Berardo, em Lisboa.

Num panorama nacional em que as publicações de banda desenhada são poucas e os artistas se desdobram mais por pequenas «edições de autor» do que pela edição constante de livros, «faz sentido mostrar a banda desenhada na sua perspectiva artística», afirma o comissário. «Em Portugal, se um autor vender dois mil livros já se considera que tem um público muito alargado», ironiza Pedro Moura que lamenta que esta expressão artística não tenha a mesma dimensão de outras, como a fotografia, a pintura ou o cinema.

Mas «o que é que lhes dá gás?». Na obra O Peregrino Blindado, Eduardo Batarda – conhecido pela sua carreira como pintor – apresenta algumas explicações humorísticas para responder à pergunta: «O pensamento sagaz; (…) a literatura, aliás…».

Com mais ou menos humor, de uma forma mais linear ou mais simbólica, os 41 artistas expostos no Museu Berardo mostram que a banda desenhada vai para além das ‘histórias aos quadradinhos’:«Em termos históricos, esta forma artística encontra raízes disseminadas numa série de técnicas e de linguagens. E estes artistas exploram esta arte de um modo particularmente pessoal, expressivo e atento a questões estéticas contemporâneas».

Organizada por afinidades artísticas, a exposição tanto exibe obras que se afirmam pela sua vertente escrita, explorando temas como autobiografias, problemas de género ou questões políticas, como mostra a sua vertente mais estética, explorando novas linguagens. E neste universo tão vasto é possível encontrar autores modernos e contemporâneos no activo, mas também nomes incontornáveis como Rafael Bordalo Pinheiro ou Carlos Botelho, autor de Ecos da Semana, publicado no semanário Sempre-Fixe, criado a 13 de Maio de 1926. O objectivo é «dar a conhecer um panorama alargado e diversificado e estimular os visitantes a procurar as ‘suas’ bandas desenhadas».

Bonecos gigantes, carros de brincar, garrafas com mensagens ilustradas e instalações complementam a exposição que é mais do que uma mostra de pranchas coloridas. Ao longo do espaço, o público é ainda surpreendido por murais de grandes dimensões da autoria de Luís Henriques, André Lemos, José Feitor, Joana Figueiredo e Miguel Carneiro, mas também por vídeos e esculturas que fazem a ligação entre a banda desenhada e outras formas de expressão artística, desafiando o público a acompanhar o processo de criação das personagens e histórias expostas.

Não faltam ainda livros, fanzines e publicações inéditas e até o primeiro álbum de banda desenhada nacional, da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro. Intitulado Inusitada Viagem do Imperador do Brasil, o humorista «retrata D. Pedro IV como um provinciano, em viagem pela Europa, num texto cheio de recados à realeza…». Assim se prova que a banda desenhada é muito mais do que histórias dedicadas ao público infanto-juvenil e vai para além das suas personagens mais emblemáticas. Ao fugir às publicações mainstream, descobre-se em Portugal uma série de autores que fazem cada vez mais da banda desenhada uma «disciplina aberta a experimentações».

TINTA NOS NERVOS;
MUSEU COLECÇÃO BERARDO – PRAÇA DO IMPÉRIO. LISBOA TEL. 213 612 878

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Tinta nos Nervos. Desenho nas veias e a BD à flor da pele

Trabalhos de 41 autores nacionais de banda desenhada enchem as paredes do Museu Colecção Berardo a partir de segunda-feira.

Não espere encontrar Tios Patinhas, nem Tintins ou heróis de banda desenhada convencionais na nova exposição do Museu Colecção Berardo, em Lisboa. Não é sítio para deixar os miúdos entretidos com bonecos durante uns minutos, mas sim para conhecer (melhor) o que têm feito os autores de banda desenhada nacionais. Quarenta e um artistas portugueses têm “Tinta nos Nervos” – expressão do escritor Raul Brandão (1876-1939) que dá nome à exposição – e o resultado desse nervosismo pode ser visto a partir de segunda-feira, às 19h30, nas paredes do Museu Colecção Berardo. “Não gosto de chamar-lhe antologia, até porque faltam aqui alguns autores, mas mostra um panorama alargado da BD portuguesa fora da literatura de massas que afecta o público infantil e juvenil”, diz ao i Pedro Vieira de Moura, comissário da exposição, professor e crítico de banda-desenhada.

No chão do Museu Berardo algumas ilustrações ainda estão por pendurar e há livros espalhados pelas várias salas à espera de serem postos num mostruário. Os trabalhos estão identificados com o nome do autor, mas as salas não têm tema, até porque, como explica Pedro Vieira Moura, “poucos têm características em comum”. “Ao contrário do que se passa em Espanha e nos Estados Unidos, a BD em Portugal não é popular, e por isso não se pode dizer que haja uma escola e temas, mas sim diversos autores.”

A maior parte dos 600 trabalhos que até 27 de Março vão estar no museu em Belém são contemporâneos, salvo duas excepções: as caricaturas de Rafael Bordalo Pinheiro, “pai da banda desenhada portuguesa”, e os desenhos de Carlos Botelho, publicados no jornal humorístico “Sempre Fixe”, entre 1928 e 1950.

Pedro Vieira Moura, que sugeriu a exposição ao museu no início de 2010, acha que este tipo de iniciativas é fundamental porque “a memória em relação à BD é muito curta”. “Se não fossem os festivais, como o da Amadora e o de Beja, não havia interesse em juntá-la e recuperá-la.”

A escolha dos autores – “Nenhum deles vive da banda desenhada e a maior parte faz ilustrações” – começou em Setembro, depois da luz verde dada pelo museu. “Já estava tudo encaminhado, conheço-os bem, mas a escolha foi tão simples como complexa, até porque não cabiam todos aqui”, afirma Pedro. Houve uma preocupação em trazer artistas de várias idades, desde o veterano Victor Mesquita, de 71 anos, criador da história de culto de ficção científica “Eternus 9”, de 1975, à ilustradora Susa Monteiro, a mais nova, de 31 anos.

A exposição é um verdadeiro curso da história da BD portuguesa, “com autores de maior visibilidade e algum sucesso comercial” (José Carlos Fernandes e Pedro Zamith) e outros mais underground (Marco Mendes, Janus e Teresa Câmara Pestana).

Além dos desenhos, também vão ser exibidos quatro filmes de animação e estarão expostos objectos invulgares como livros de artistas (um inédito de Eduardo Batarda) e fanzines (a abreviatura para fanatic magazines, revistas sofisticadas publicadas por fãs) de João Bragança. A colecção de fanzines “Succedâneo”, com mais de 30 números, inclui capas em forma de carteira, de luva e até de hóstia. “O objectivo é apresentar objectos que não lembram a BD clássica e conservadora”, diz o comissário.

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