Etiqueta: Teresa Câmara Pestana

O regresso do Gambuzine

Prova viva de que há edição independente de autores portugueses, fora do círculo de influência da distribuidora Chili com Carne, o fanzine/revista “Gambuzine” regressou com o 2º número desta segunda série, distribuído em finais de 2010.
Articulando os autores portugueses, com uma forte presença de autores do norte da Europa, fruto dos contactos que a editora Teresa Câmara Pestana criou durante o tempo que viveu na Alemanha, este novo “Gambuzine” tem como destaque principal o alemão Wittek, objecto de uma entrevista e da publicação de cinco histórias, que mostram bem a grande versatilidade do seu traço, tão à vontade no realismo, como na caricatura. Na 1ª história, “A Ilha da Cura”, um conto fantástico na linha das histórias da E.C: Comics, ambientado no Japão medieval, Wittek vai beber à gravura japonesa, com excelente resultados, enquanto que nas histórias de temática autobiográfica, opta por um registo mais caricatural, muito expressivo e divertido.

Dos mais de 20 artistas cujos trabalhos enchem as 100 páginas deste “Gambuzine”, um pouco menos de metade são portugueses, com destaque para Teresa Câmara Pestana, que assina 4 histórias (uma delas a partir de um texto do seu primo, Vasco Câmara Pestana) e parece ter criado escola, a avaliar pela influência do seu traço, detectável nos trabalhos de Fruzzie e Schmicko. Além desse núcleo duro que colabora habitualmente com Teresa Câmara Pestana, há também autores nacionais vindos de outros lados, como Pedro Rocha Nogueira, que já tem trabalhos editados pelas Bedetecas de Lisboa e Beja, e Álvaro, presença habitual no catálogo da Pedranocharco, que se estreia no “Gambuzine” com “Aula de Educação Sexual”, uma divertida história protagonizada por uma professora, cujas semelhanças fisionómicas com a anterior Ministra da Educação, devem ser mais do que mera coincidência…
Para além de dar a conhecer autores alemães e austríacos pouco conhecidos em Portugal, como Ulli Lust, vencedora de um dos Prémios do último Festival de Angoulême, que foi publicada em Portugal pela primeira vez no “Gambuzine”, o fanzine de Teresa Câmara Pestana é também um espaço de liberdade para os autores portugueses, que é importante manter. Cabe aos leitores, através da compra do “Gambuzine”, que em Coimbra se encontra à venda na Livraria Dr. Kartoon, contribuir para a sobrevivência deste belo projecto, só possível graças ao grande dinamismo da sua responsável.
(Gambuzine n.º 2, Vários Autores, ed. Teresa Câmara Pestana, 100 págs, 10,00€)

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A Banda de Cá

Um panorama alargado da banda desenhada portuguesa: revelação e balanço

Se a encararmos como um campo alargado, que inclua a caricatura e a ilustração, a banda desenhada é, sem dúvida, e ao lado do cinema, um dos produtos culturais mais paradigmáticos da modernidade. Filho da vida urbana, do divertimento, mas também das sociedades abertas com suas liberdades públicas, o mundo dos ‘quadrinhos’ passaria dos jornais para os livros, gerando ao longo do século XX um novo género de narrativa gráfico-literária que se exprime quase sempre numa linguagem popular mas capaz de abrir todo um novo território de experimentações visuais.

Como todas as existências icónicas da sociedade de massas, a BD disseminou-se por todo o Ocidente, ganhando fortíssimas e singulares tradições na Bélgica, na França, ou nos EUA, criando mercados alargados em países como a Itália e a Espanha e gerando especificidades importantes no Leste da Europa.

Portugal não foi exceção a esta contaminação, ainda que, como noutros domínios artísticos, a produção portuguesa conheça as dificuldades inerentes a um mercado estreito e demasiado condicionado pela visão ‘infanto-juvenil’ da BD e pela supremacia franco-belga na oferta e na procura.

Estas condições não impediram, porém, o florescimento nas últimas décadas de uma banda desenhada de autor, exigente do ponto de vista gráfico e, em alguns casos, com um arrojo experimental.

“Tinta nos Nervos”, uma exposição comissariada por Pedro Vieira de Moura, que revisita a produção lusa recente nesta área, mostra precisamente este panorama, construindo uma visão de conjunto largamente satisfatória.

Seja pela diversidade de abordagem e sensibilidades estéticas, seja pela real valia de alguns dos participantes, a BD portuguesa aproxima-se nesse particular das restantes artes visuais locais: na ausência de escolas dominantes, ela vive sobretudo da dissonância estética entre as suas personalidades mais vivas.

Mostrando pranchas e sequências que salvaguardam as condições narrativas da BD, mas também livros seminais, revistas e fanzines historicamente marcantes e objetos que se aproximam da linguagem gráfica, a exposição tem a enorme vantagem de mostrar esta diversidade através do trabalho de 40 autores.

Lado a lado, coexistem trabalhos que valorizam a dimensão social e política (Teresa Câmara Pestana, Miguel Rocha), ou vincam visões da cidade (António Jorge Gonçalves, José Carlos Fernandes), caracterizam os costumes (Pepedelrey) ou comentam a cultura local (Janus, Nuno Sousa, Miguel Carneiro), exibem estilos mais realistas (Marco Mendes), aproximam-se do fantástico (Victor Mesquita, João Maio Pinto), do onírico (Luís Henriques), da abstração (Cátia Serrão) ou especulam sobre as próprias condições gráficas (Jucifer), adotam visões mais literárias (Diniz Conefrey), tiram partido da cor em visões pop (Nuno Saraiva) ou da tonalidade expressionista (Ana Cortesão, André Lemos, Pedro Zamith), com humor (Alice Geirinhas, Carlos Zíngaro) ou pela exploração de subgéneros como a autobiografia (Marcos Farrajota, Paulo Monteiro). Entretanto, há ainda espaço para sinalizar algumas zonas de fronteira com a pintura, pelo campo comum do desenho (Isabel Baraona, Mauro Cerqueira), pela partilha de uma mesma cultura pop e vocação satírica (Eduardo Batarda), ao mesmo tempo que se incluem dois antecedentes (Rafael Bordalo Pinheiro e Carlos Botelho) que ajudam a dar profundidade histórica ao campo.

Como imagem de fundo de uma nebulosa tão heteróclita fica uma genérica capacidade de infiltração temática nos mais diversos assuntos e contextos sociais, com uma variedade de abordagens que pode oscilar entre o humor e a metafísica.

“Tinta nos Nervos” — A BD Levada a Sério…

Foi inaugurada, no passado dia 10 de Janeiro, a exposição “Tinta nos Nervos – Banda Desenhada Portuguesa”, no Museu Colecção Berardo do Centro Cultural de Belém.
Estendida por diversas salas do Museu, e comissariada por Pedro Moura, a mostra irá estar patente até ao dia 27 de Março.
Uma das mais importantes montra de que há memória na Banda Desenhada portuguesa, a exposição comissariada por Pedro Moura apresenta obras de Alice Geirinhas, Ana Cortesão, André Lemos, António Jorge Gonçalves, Bruno Borges, Carlos Botelho, Carlos Pinheiro, Carlos Zíngaro, Cátia Serrão, Daniel Lima, Diniz Conefrey, Eduarda Batarda, Filipe Abranches, Isabel Baraona, Isabel Carvalho, Isabel Lobinho, Janus, João Fazenda, João Maia Pinto, José Carlos Fernandes, Jucifer (Joana Figueiredo), Luís Henriques, Marco Mendes, Marcos Farrajota, Maria João Worm, Mauro Cerqueira, Miguel Carneiro, Miguel Rocha, Nuno Saraiva, Nuno Sousa, Paulo Monteiro, Pedro Burgos, Pedro Nora, Pedro Zamith, Pepedelrey, Rafael Bordalo Pinheiro, Richard Câmara, Teresa Câmara Pestana, Tiago Manuel e Victor Mesquita.
Como bem refere Jorge Machado-Dias no seu blog Kuentro, «(…) é uma oportunidade única para aceder a tão vasta (embora não auto-conclusiva) informação sobre a actual BD portuguesa (…)».
E este crítico, editor e divulgador, diz ainda: «(…) À partida, a filosofia de que partiu esta abordagem à Banda Desenhada – tratando-se especialmente da portuguesa –, é algo com que estamos plenamente de acordo e cuja visita deveria ser obrigatória para os directores dos Festivais de banda desenhada em Portugal, para perceberem como fazer um festival de BD de larga abrangência e potencialmente cativador de maiores e mais variados públicos. Isto apesar de, diga-se de passagem, Paulo Monteiro, o director do Festival de Beja, ter vindo propositadamente de Beja para esta inauguração, sendo que é também, um dos autores expostos…
Para já, deixo ficar apenas uma nota sobre a feliz escolha por Pedro Vieira Moura, da expressão que melhor define a BD portuguesa actual: banda desenhada de autor! Nada mais apropriado, uma vez que os portugueses são especializados em algumas áreas “de autor”, sendo o cinema a mais conhecida. E tal como o cinema português é parcamente visto pelos portugueses, também a BD portuguesa sofre do mesmo mal: vende-se pouco! E isto não é uma crítica, é uma constatação. Aliás a Sara Figueiredo Costa aborda alguns pontos desta questão no texto que produziu para o Catálogo desta exposição – o porquê das fracas vendas da BD portuguesa (…).
O catálogo da exposição, com textos de Pedro Moura, Sara Figueiredo e Domingos Isabelinho contém 138 ilustrações e a biografia de todos os autores expostos, sendo distribuído pela Chili Com Carne.
A exposição tem entrada gratuita e pode ser visitada no Museu Colecção Berardo, Praça do Império, Lisboa, até 27 de Março, de domingo a sexta, das 10h00 às 19h00 e sábado das 10h às 22h.

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Tinta nos Nervos. Desenho nas veias e a BD à flor da pele

Trabalhos de 41 autores nacionais de banda desenhada enchem as paredes do Museu Colecção Berardo a partir de segunda-feira.

Não espere encontrar Tios Patinhas, nem Tintins ou heróis de banda desenhada convencionais na nova exposição do Museu Colecção Berardo, em Lisboa. Não é sítio para deixar os miúdos entretidos com bonecos durante uns minutos, mas sim para conhecer (melhor) o que têm feito os autores de banda desenhada nacionais. Quarenta e um artistas portugueses têm “Tinta nos Nervos” – expressão do escritor Raul Brandão (1876-1939) que dá nome à exposição – e o resultado desse nervosismo pode ser visto a partir de segunda-feira, às 19h30, nas paredes do Museu Colecção Berardo. “Não gosto de chamar-lhe antologia, até porque faltam aqui alguns autores, mas mostra um panorama alargado da BD portuguesa fora da literatura de massas que afecta o público infantil e juvenil”, diz ao i Pedro Vieira de Moura, comissário da exposição, professor e crítico de banda-desenhada.

No chão do Museu Berardo algumas ilustrações ainda estão por pendurar e há livros espalhados pelas várias salas à espera de serem postos num mostruário. Os trabalhos estão identificados com o nome do autor, mas as salas não têm tema, até porque, como explica Pedro Vieira Moura, “poucos têm características em comum”. “Ao contrário do que se passa em Espanha e nos Estados Unidos, a BD em Portugal não é popular, e por isso não se pode dizer que haja uma escola e temas, mas sim diversos autores.”

A maior parte dos 600 trabalhos que até 27 de Março vão estar no museu em Belém são contemporâneos, salvo duas excepções: as caricaturas de Rafael Bordalo Pinheiro, “pai da banda desenhada portuguesa”, e os desenhos de Carlos Botelho, publicados no jornal humorístico “Sempre Fixe”, entre 1928 e 1950.

Pedro Vieira Moura, que sugeriu a exposição ao museu no início de 2010, acha que este tipo de iniciativas é fundamental porque “a memória em relação à BD é muito curta”. “Se não fossem os festivais, como o da Amadora e o de Beja, não havia interesse em juntá-la e recuperá-la.”

A escolha dos autores – “Nenhum deles vive da banda desenhada e a maior parte faz ilustrações” – começou em Setembro, depois da luz verde dada pelo museu. “Já estava tudo encaminhado, conheço-os bem, mas a escolha foi tão simples como complexa, até porque não cabiam todos aqui”, afirma Pedro. Houve uma preocupação em trazer artistas de várias idades, desde o veterano Victor Mesquita, de 71 anos, criador da história de culto de ficção científica “Eternus 9”, de 1975, à ilustradora Susa Monteiro, a mais nova, de 31 anos.

A exposição é um verdadeiro curso da história da BD portuguesa, “com autores de maior visibilidade e algum sucesso comercial” (José Carlos Fernandes e Pedro Zamith) e outros mais underground (Marco Mendes, Janus e Teresa Câmara Pestana).

Além dos desenhos, também vão ser exibidos quatro filmes de animação e estarão expostos objectos invulgares como livros de artistas (um inédito de Eduardo Batarda) e fanzines (a abreviatura para fanatic magazines, revistas sofisticadas publicadas por fãs) de João Bragança. A colecção de fanzines “Succedâneo”, com mais de 30 números, inclui capas em forma de carteira, de luva e até de hóstia. “O objectivo é apresentar objectos que não lembram a BD clássica e conservadora”, diz o comissário.

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A BD portuguesa à procura do futuro

Num contexto de crise, num mercado livreiro limitado, onde a BD sempre foi um nicho, autores e pequenos editores de banda desenhada esforçam-se para criar alternativas à edição tradicional.

E elas existem, “porque se quer editar e se acha preciso”, justifica Marcos Farrajota, da Chili com Carne, e por títulos como “Mocifão”, “Defier”, “Virgin’s Trip”, “Fato de macaco”, “Postais de Viagem”, “Gambuzine”, “Efeméride”, “Super Pig”, “A Fórmula da Felicidade”, “Noitadas, Deprês e Bubas”, “Tomorrow The Chinese Will Deliver The Pandas”, “O filme da minha vida” ou “Murmúrios das Profundezas” têm passado algumas (das mais?) interessantes propostas dos quadradinhos portugueses.
Comuns a todos são as tiragens reduzidas – raramente atingem os 500 exemplares – e o circuito de distribuição restrito: “alfarrabistas, festivais de BD”, enumera Geraldes Lino, completando Farrajota, com: “lojas especializadas em BD ou design e eventos ligados à edição independente”. E acrescenta ainda “algumas livrarias, onde (com raras excepções) existe um desdém por estas edições, que são escondidas e nunca repostas”, o que é corroborado por Pepedelrey, da El Pep, que referencia um circuito de distribuição “atribulado, com os lojistas a bloquearem constantemente as iniciativas”. E, claro, vendas on-line, cultivadas por quase todos, e trocas com editores similares de outros países.
Por isso e porque a inércia é grande, os stoks podem demorar 1, 2, 3 anos a escoar… Excepção foi “Murmúrios das Profundezas”, colectânea de BDs inspiradas em Lovercraft, cujos 200 exemplares “voaram” em “dois rápidos meses devido à expectativa que criamos junto dos potenciais leitores”, revela Rui Ramos, o mentor do projecto. Mas sem reedição prevista, uma vez que a opção foi o offset e não a impressão digital, “a alma do negócio” da El Pep, pois permite “imprimir de novo quando se esgota uma tiragem”.
Perante tudo isto, “os autores, infelizmente, são pagos só em géneros” (livros), diz Teresa Pestana, ou usam o “dinheiro dos lucros para financiar novos livros”, exemplifica Rui Ramos. A solução, para Pepedelrey, seria “criar o tão desejado mercado nacional de BD: existem autores, editores e consumidores; faltam as estruturas de distribuição e promoção correctas”.
Comum a todos, também, é a enorme vontade – concretizada – de ser e criar. Por isso, trabalha-se sempre em novos projectos: G. Lino, prepara “o nº 4 do fanzine Efeméride, dedicado ao Tintin” e o Gambuzine #2 “sai em Novembro, com colaborações de alguns poetas portugueses vivos”. A equipa dos “Murmúrios…”editará ainda este ano “Voyager”, já parcialmente disponível em, a MMMNNNRRRG “O Pénis Assassino”, e a Chili Com Carne “uma antologia internacional com o festival Crack (Roma), para Junho”. Em busca de outros mercados, a El Pep que “a partir de agora só fará edições em inglês”, a lançar “nos principais encontros internacionais e só depois em Portugal, está a produzir “A tua carne é má” e “Defier #2”.
Tantos títulos parecem contrariar a afirmação convicta de G. Lino de que “a BD portuguesa não tem futuro”, o que se deve “a uma fatal conjunção de desinteresses, descrédito e a um meio demasiado pequeno e amiguista que neutraliza à partida qualquer objectividade e evolução”, corrobora Teresa Pestana.
Na dúvida, Farrajota acredita que este será o caminho “se houver futuro”, enquanto Pepedelrey pensa que “é um caminho válido e o único que tem contribuído para o desenvolvimento desta expressão artística”. Conclui Rui Ramos: “o futuro vai depender acima de tudo da imaginação, inovação e capacidade de organização, empenho e produção dos autores nacionais e da sua capacidade de captar a atenção do público”.

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Sugestões de leitura

SuperHomem no século XXI
Colectivo
Depois de Little Nemo e Príncipe Valente, o fanzine “Efeméride” (em A3, a cores), revisita o mito do Super-Homem nos seus 70 anos, enquanto tal ou adequando-o aos universos pessoais dos autores, em tom de paródia e/ou homenagem.

Mocifão
Nuno Duarte, Untxura, Nuno Silva
Em tom caricatural e jogando com as regras narrativas e gráficas da BD, o dia a dia atribulado de um desajustado social, insatisfeito consigo e com o mundo, em cores quase sempre sombrias como o (anti-)herói, e um toque de non-sense.

Gambuzine
Colectivo
Cultora e herdeira da BD underground, Teresa Pestana continua a desenvolver a dupla faceta de autora/editora neste cocktail europeu de divagações, sonhos, poemas e contos, num preto e branco com (quase) todos os tons, em off-set sedoso (sic).


Escrito Por

F. Cleto e Pina

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Jornal de Notícias

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A maioridade na Amadora

Festival de Banda Desenhada começa hoje; Ziraldo, Cameron Stewart, Achdé e Gerra, autores de Lucky Luke, presentes este fim-de-semana; Previsto o lançamento de uma dezena de obras de autores portugueses

Começa hoje a 18ª edição do Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora, que abre as suas portas para o fantástico mundo dos quadradinhos até 4 de Novembro. Do programa, destaque para as exposições “Salazar, Agora na Hora da sua Morte”, sobre a obra de Miguel Rocha e João Paulo Cotrim, que venceu os Prémios Nacionais de BD para Melhor Álbum Português, Melhor Argumento e Melhor Desenho, em 2006, “As 10 BD’S do Século XX” (passeio pelos universos de “Little Nemo in Slumberland”, “Krazy Kat”, “Tintin”, “Batman”, “Spirit”, “Peanuts”, “Astérix”, “Blueberry”, “Corto Maltese” e “Maus”, “Astérix e seus Amigos”, uma homenagem de diversos autores a Uderzo, pelos seus 80 anos, e o espaço dedicado às novidades editoriais e a projectos em curso nacionais. Aliás, é de salientar o facto de estar previsto o lançamento, durante o FIBDA, de mais de uma dezena de obras de autores portugueses.
O tema desta edição, no ano em que o FIBDA comemora 18 anos, é “Maioridade” mas, como em qualquer ser humano, não é o simples atingir do patamar dos 18 anos que concede aquele estado. Esta opinião é partilhada por diversos intervenientes ligados à 9ª arte nacional, que referiram ao JN alguns aspectos em que, segundo eles, o Festival necessita de crescer. À cabeça é apontada o local de realização do festival que este ano se mantém no Fórum Luís de Camões, na Brandoa, reconhecidamente com as características logísticas necessárias para albergar um evento deste tipo, mas mal situado em termos de acessibilidade. Por isso João Miguel Lameiras, crítico e livreiro, aponta a necessidade “de arranjar uma casa fixa, em vez de mudar de dois em dois anos”, sendo secundado por Geraldes Lino, especialista em fanzines, que pede que “o núcleo principal se localize, definitivamente, num ponto central da Amadora, como era a saudosa Fábrica da Cultura”.
Puxando a brasa à sua sardinha, Marcos Farrajota e Teresa Câmara Pestana, autores e editores de fanzines, gostariam, respectivamente, de mudar “tudo” e de “ter os autores marginais como principal atracção do festival”, enquanto que Machado Dias, editor da pedranocharco e do “BDJornal” apostaria numa “equipa organizadora maior com um orçamento compatível”, a quem Lameiras pediria “uma maior profissionalização”.
Outro ponto referido, por José Freitas, editor da Devir, é a obrigatoriedade de “uma maior ligação com a realidade efectiva do público e dos seus interesses, ou seja, deixar de fazer um FIBDA para leitores de BD franco-belga com mais de 50 anos e admitir finalmente que o público de BD de hoje não é o mesmo de há dez ou quinze anos atrás”, pois prefere comics de super-heróis e manga (BD japonesa).
A mesma ideia é partilhada por Hugo Jesus, responsável pelo portal Central Comics, que pede à organização para “virar o festival para um publico mais jovem” e “para apostar definitivamente na área comercial”, desejo indirecto de José Freitas quando sugere ao FIBDA para “passar a olhar minimamente para o mercado para saber o que se editou e o que vende”. José Carlos Fernandes, o mais destacado autor português dos últimos anos, pensa que a maioridade só será atingida se (e quando) “houver um mercado saudável de BD em Portugal” pois, “se houver mercado, surgem editoras e autores nacionais”; sem isso, “o FIBDA será sempre a fachada enganadora de um edifício inexistente”. O que reitera Lameiras que, considerando “as crises de adolescência do Festival um reflexo das debilidades do próprio mercado nacional de BD” tem algumas reservas “pois o estado semi-comatoso do mercado deixa antever um prognóstico reservado quanto ao futuro do festival…”. 

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Destaques

Do programa do primeiro fim-de-semana do Festival de BD da Amadora, enquanto se aguarda por Manara (a 27 e 28) e Trondheim (3 e 4 de Novembro) destaca-se a presença do brasileiro Ziraldo, autor, entre outros títulos destinados à infância, de “O Menino Maluquinho”, Achdé e Guerra, actuais responsáveis de Lucky Luke, Cameron Stewart, desenhador de “Cat Woman”, “B.P.R.D.” ou “Seaguy”, Ilan Manouach, Godi, Zidrou e Jean-Louis Marco.
No que respeita a lançamentos, destaque para o regresso do Corvo, o mais desajeitado super-herói português, em “Laços de Família” (ASA), com desenhos de Luís Louro e argumento de Nuno “Homem-que-mordeu-o-cão” Markl, a par do sexto e derradeiro volume de “A Pior Banda do Mundo” (Devir), de José Carlos Fernandes.
Terão também apresentação “Obrigado patrão” (ASA), que Rui Lacas lançou este ano nas Éditions Pacquet”, “SuperPig #3”, de Carlos Pedro e Mário Freitas, e “C.A.O.S.#3”, de Filipe Teixeira, Fernando Dordio Campos e Carlos Geraldes (ambos da Kingpin Comics), “Sexo, Mentiras e Fotocópias”, de Álvaro, “Portfólio”, de José Abrantes, bem como das revistas “BDjornal #20” e “BDVoyeur #2” (pedranocharco).


Escrito Por

F. Cleto e Pina

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Jornal de Notícias

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Surpresa

Tem por título “Postais de Viagem”, começou como um ensaio sobre vudu intitulado “Pogo in Togo”, mas, com o tempo (15 anos…), assumiu a forma de postais ilustrados complementados com um texto denso mas depurado – de pormenores desnecessários e também de juízos de valor ou preconceitos – sobre a religiosidade africana.
Algures na fronteira entre o caderno de viagem, o texto ilustrado e a banda desenhada, é fruto da experiência vivida no Togo pela sua autora (e também editora), Teresa C. Pestana, com larga experiência nos quadradinhos, desenvolvida no seu fanzine “Gambuzine”, que utiliza o seu traço característico, baseado em fortes contrastes de preto e branco, quase sempre esquemático, algumas vezes quase realista, para nos guiar – com base numa pretensa busca (iniciática…) de alguém desaparecido – pelos trilhos misteriosos da religião, da superstição e da crendice africanas, das suas cerimónias e rituais, dos seus múltiplos deuses e da forma como eles influenciam o dia a dia (tornando residual a influência católica…).
E num tempo em que as potencialidades das novas tecnologias informáticas, aproximaram as edições de autor (ou de pequenos editores) das edições, digamos,”profissionais”, se a dispensa da distribuição tradicional por parte daqueles obriga a atenção redobrada para as encontrar, torna mais agradável a descoberta de surpresas como esta (disponível em www.gambuzine.com).


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F. Cleto e Pina

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Jornal de Notícias

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