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Tinta nos Nervos. Desenho nas veias e a BD à flor da pele

Trabalhos de 41 autores nacionais de banda desenhada enchem as paredes do Museu Colecção Berardo a partir de segunda-feira.

Não espere encontrar Tios Patinhas, nem Tintins ou heróis de banda desenhada convencionais na nova exposição do Museu Colecção Berardo, em Lisboa. Não é sítio para deixar os miúdos entretidos com bonecos durante uns minutos, mas sim para conhecer (melhor) o que têm feito os autores de banda desenhada nacionais. Quarenta e um artistas portugueses têm “Tinta nos Nervos” – expressão do escritor Raul Brandão (1876-1939) que dá nome à exposição – e o resultado desse nervosismo pode ser visto a partir de segunda-feira, às 19h30, nas paredes do Museu Colecção Berardo. “Não gosto de chamar-lhe antologia, até porque faltam aqui alguns autores, mas mostra um panorama alargado da BD portuguesa fora da literatura de massas que afecta o público infantil e juvenil”, diz ao i Pedro Vieira de Moura, comissário da exposição, professor e crítico de banda-desenhada.

No chão do Museu Berardo algumas ilustrações ainda estão por pendurar e há livros espalhados pelas várias salas à espera de serem postos num mostruário. Os trabalhos estão identificados com o nome do autor, mas as salas não têm tema, até porque, como explica Pedro Vieira Moura, “poucos têm características em comum”. “Ao contrário do que se passa em Espanha e nos Estados Unidos, a BD em Portugal não é popular, e por isso não se pode dizer que haja uma escola e temas, mas sim diversos autores.”

A maior parte dos 600 trabalhos que até 27 de Março vão estar no museu em Belém são contemporâneos, salvo duas excepções: as caricaturas de Rafael Bordalo Pinheiro, “pai da banda desenhada portuguesa”, e os desenhos de Carlos Botelho, publicados no jornal humorístico “Sempre Fixe”, entre 1928 e 1950.

Pedro Vieira Moura, que sugeriu a exposição ao museu no início de 2010, acha que este tipo de iniciativas é fundamental porque “a memória em relação à BD é muito curta”. “Se não fossem os festivais, como o da Amadora e o de Beja, não havia interesse em juntá-la e recuperá-la.”

A escolha dos autores – “Nenhum deles vive da banda desenhada e a maior parte faz ilustrações” – começou em Setembro, depois da luz verde dada pelo museu. “Já estava tudo encaminhado, conheço-os bem, mas a escolha foi tão simples como complexa, até porque não cabiam todos aqui”, afirma Pedro. Houve uma preocupação em trazer artistas de várias idades, desde o veterano Victor Mesquita, de 71 anos, criador da história de culto de ficção científica “Eternus 9”, de 1975, à ilustradora Susa Monteiro, a mais nova, de 31 anos.

A exposição é um verdadeiro curso da história da BD portuguesa, “com autores de maior visibilidade e algum sucesso comercial” (José Carlos Fernandes e Pedro Zamith) e outros mais underground (Marco Mendes, Janus e Teresa Câmara Pestana).

Além dos desenhos, também vão ser exibidos quatro filmes de animação e estarão expostos objectos invulgares como livros de artistas (um inédito de Eduardo Batarda) e fanzines (a abreviatura para fanatic magazines, revistas sofisticadas publicadas por fãs) de João Bragança. A colecção de fanzines “Succedâneo”, com mais de 30 números, inclui capas em forma de carteira, de luva e até de hóstia. “O objectivo é apresentar objectos que não lembram a BD clássica e conservadora”, diz o comissário.

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Tex Willer em Moura

Principal herói Bonelli é destaque da 16ª edição daquele festival de BD alentejano; Fabio Civitelli presente no próximo fim-de-semana; Evento homenageia os gatos da BD e também José Abrantes, Catherine Labey e Susa Monteiro

Tex Willer, o famoso ranger dos quadradinhos italianos, chega hoje a Moura, no Alentejo. Não em busca de um qualquer malfeitor, como é habitual, mas como convidado especial de um festival já na 16ª edição. Em sua companhia, em lugar de Kit Carson, Kit ou Jack Tigre, estarão Fabio Civitelli, um dos seus mais destacados desenhadores da actualidade (ver entrevista) e os seus originais, e José Carlos Pereira Francisco, responsável pelo blog português de Tex (http://texwiller.blog.com), representante em Portugal da Mythos Editora e um dos seus maiores coleccionadores mundiais, que mostrará em Moura dois milhares de itens da sua colecção. E é oportunidade também para conhecer a vaga de novos desenhadores responsáveis pelo cow-boy, entre os quais Corrado Mastantuono, Pasquale Del Vecchio ou Frisenda.

Mas a verdade é que o tema do MouraBD 2007, que decorre no castelo local, é “O Gato”, sendo dada uma panorâmica geral destes felinos na BD e no Cartoon, a par de retrospectivas da obra de José Abrantes, Catherine Labey e Susa Monteiro, que, juntamente com Civitelli, estarão presentes no dia 2 de Junho, véspera de encerramento do evento de cujo programa constam ainda um ciclo de “Cinema e BD” e uma feira do Livro.

Quem é Tex Willer?

F. Cleto e Pina

Tex, que nasceu na revista “Collana del Tex”, a 30 de Setembro de 1948, e é, sem dúvida, o símbolo por excelência do império de quadradinhos populares Bonelli. Os seus criadores foram Giovanni Luigi Bonelli (texto) e Aurélio Galleppini “Galep” (desenho). De seu nome completo Tex Willer, membro dos célebres rangers do Texas, assume, simultaneamente o papel de investigador, justiceiro e até chefe índio, sob o nome de Águia da Noite. Ao seu lado tem quase sempre o seu velho amigo Kit Carson, o índio Jack Tigre e Kit Willer, seu filho. Pondo a justiça e a legalidade – a par da amizade – antes e acima de tudo, não hesita em assumir o papel de juiz e carrasco, quando tal é necessário. Apesar de beber parte da sua inspiração nos grandes westerns cinematográficos, Tex não é um western tradicional, pois muitas vezes são os índios que têm o papel de “bons” e um certo misticismo é presença recorrente nas histórias, entre as habilidades dos feiticeiros índios ou os estranhos poderes de Mefisto, o seu maior inimigo.

Com uma legião de fãs indefectíveis, um pouco por todo o mundo – acaba de chegar à Rússia – Tex é recordista de vendas em Itália, com 230 000 exemplares mensais (só da série regular), e no Brasil (40 000 ex.), onde é publicado pela Mythos Editora, que edita uma dezena de títulos de Tex, entre novas histórias, reedições e edições especiais, que chegam depois a Portugal onde vendem uns invejáveis 3 a 4 mil exemplares por mês.

“Tex é uma personagem que eu sempre amei”, afirma Fabio Civitelli, o desenhador responsável pela edição comemorativa dos 60 anos do herói

F. Cleto e Pina

Chama-se Fabio Civitelli, nasceu a 9 de Abril de 1955, e aos “sete, oito anos apaixonei-me pela BD. Quem mais me prendia era Tex, que continuo a ler até hoje”. Sem formação artística, cultivou “diariamente a paixão pelo desenho e sempre sonhei tornar-me um desenhador profissional”. Nasceria assim o seu traço luminoso, de linhas seguras, limpo de pormenores desnecessários, quase sempre sem tons intermédios entre o preto e o branco, que contrasta equilibradamente.

Mais tarde, “nos anos 70, li com avidez revistas de BD de autor, para tentar assimilar as novas tendências. Graças a Graziano Origa, o meu primeiro mestre, que dirigia um conhecido estúdio de Milão, aos 19 anos comecei a trabalhar em quadradinhos de bolso, eróticos e de terror. Cinco anos depois, em 1979, entrei para a Sergio Bonelli Editore, começando uma belíssima colaboração que prossegue até hoje”. O que não deixa de ser curioso já que acompanhou “muito a BD de autor”, mas o facto de “sempre me ter considerado um autor “popular” condicionou a minha escolha”. E lembra que “o meu ingresso na equipa de Tex foi decidido pelo Sergio Bonelli em pessoa. Senti-me um receoso, porque nunca tinha desenhado um western. Mas Tex é uma personagem que eu sempre amei como leitor e, ao ganhar aos poucos segurança e conhecimento do Velho Oeste, apaixonei-me tanto que não tenho vontade de fazer outro trabalho”.

Em Itália, os fumetti Bonelli vendem-se em quiosques, a preço baixo, graças ao pequeno formato, ao preto e branco e papel simples, o que, a par “das maiores exigências de produtividade e pontualidade nas entregas” faz com que muitos ainda os considerem uma forma menor de BD. Civitelli, que sempre tentou “experimentar e inovar”, considera que essa distinção “decaiu com os anos”, sublinhando que “é por opção editorial que a Bonelli se preocupa em oferecer o seu produto a um público o mais vasto possível, o que só é possível nos quiosques. A BD “de autor” vive nas lojas especializadas, com poucos milhares de leitores. As edições Bonelli contam nos seus quadros com muitos talentos criativos que produzem BD de elevada qualidade, de géneros variados, capazes de contentar todos os leitores, com um custo muito competitivo”.

Relativamente a Tex destaca “o carácter forte, decidido e pouco disposto a acordos, embora menos hoje que em tempos idos”, e tem como objectivo “trabalhar sempre no limite para contentar primeiro o editor e depois as centenas de milhares de leitores exigentes”. 

E confessa-se honrado “por ter sido escolhido para desenhar a história comemorativa dos 60 anos de Tex, como reconhecimento pelos 23 anos que já lhe dediquei, por isso estou a empenhar-me ao máximo”.

Em Moura, Civitelli conta “encontrar muitos leitores aficionados e atentos, aos quais mostrarei com prazer inéditos, incluídas as primeiras 35 pranchas daquela história, e dos quais espero críticas, conselhos e sugestões”.


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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