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Francisco Ibañez faleceu aos 87 anos

Criador de “Mortadelo y Filemón” foi possivelmente o autor mais influente da BD espanhola

Natural de Barcelona, onde nasceu em 1936, no seio de uma família de classe média, Francisco Ibáñez Talavera, criador da dupla “Mortadelo y Filemón” (“Salamão e Mortadela” na versão portuguesa), faleceu aos 87 anos.
Descobriu cedo a sua vocação e aos 11 anos, o envio de um desenho para a revista “Chicos” resultou no seu primeiro trabalho pago. Estudos de Contabilidade levaram-no a trabalhar como paquete num banco aos 14 anos, mas em paralelo desenhava para diversas publicações. Em 1957, a percepção de que ganhava mais a desenhar do que a trabalhar como bancário, levou-o a tentar a sua sorte, começando a colaborar com a editora Bruguera, a mais importante do país vizinho na época.
Um ano depois, a mítica revista espanhola “Pulgarcito” publicava, ainda a preto e branco. a primeira página de “Mortadelo y Filémon, agencia de información”, uma sátira à dupla Sherlock Holmes/Dr. Watson e também à CIA, protagonizada por duas personagens com nome de carne de porco, das mais atrapalhadas e perigosas que a BD conheceu.
As histórias longas a cores de Mortadelo y Filémon chegariam na década seguinte, fazendo explodir o êxito da dupla e obrigando o autor a assegurar uma produção insana, forçada pela mercantilização e industrialização das suas personagens. Isso obrigou ao recurso a colaboradores, o que Ibañez negou durante décadas e a quem nunca concedeu o devido crédito, e mesmo à “clonagem” de personagens e séries do mercado franco-belga, sendo o caso mais evidente “El botones Sacarino”, cópia descaracterizada de “Spirou”.
Naquelas séries, tal como em “Rompetechos”, “Pepe Gotera y Otilio” ou “13, rue del Percebe”, Ibáñez afirmou-se como génio do gag visual centrado no absurdo e na violência explícita, tudo narrado a ritmo acelerado apesar da multiplicação de diálogos palavrosos e de vinhetas repletas de pormenores, cultivando um traço arredondado, muito ágil e dinâmico, e o recurso frequente a metáforas visuais que se tornaram uma das suas imagens de marca.
Em Portugal foram publicados dezena e meia dos cerca de 200 álbuns originais de “Mortadelo y Filémon”, a maioria deles pela Paralelo Editora na década de 1970, tendo marcado presença também nos catálogos da Meribérica e da ASA.
Polémicas à parte, como herança Francisco Ibáñez deixa 50 mil pranchas de BD, mais de 100 milhões de álbuns vendidos em Portugal, França, Alemanha, Grécia, Suécia, Dinamarca, Itália ou Brasil, e criações que divertiram e distraíram gerações e fizeram dele, possivelmente, o autor mais influente da BD espanhola.


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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Os Irmãos Mais Novos de Tintin

Joana, João e o Macaco Simão foram criados por Hergé há 75 anos

Corria o ano de 1936. O sucesso de Tintin – então a viver a sua sexta aventura, “O Ídolo Roubado” – era crescente, mas não fazia a unanimidade. A prová-lo, chegava a Hergé uma carta da revista católica francesa “Coeurs Vaillants”, onde se lia que o herói “não ganha a sua vida, não vai à escola, não tem pais, não come, não dorme… Isso não é lógico”. E, em jeito de encomenda, desafiava Hergé a criar alguém “cujo pai trabalhe, que tenha uma mãe, uma irmã mais nova, um animal de estimação”, contou o desenhador numa entrevista a Numa Sadoul.
Recuperando personagens de um trabalho publicitário Hergé criou assim Jo, Zette e Jocko (rebaptizados em Portugal como Joana, João e o Macaco Simão), estreados há 75 anos, a 19 de Janeiro de 1936, e que viveriam três aventuras a preto e branco, (remontadas e) divididas por cinco álbuns quando foram coloridas, nos anos 1950. Os seus protagonistas eram os irmãos Joana e João, o pai, o engenheiro Legrand, a mãe, doméstica, e Simão, um macaco, o tal animal de estimação da “encomenda”.
O traço e a estrutura narrativa estavam próximos dos utilizados em Tintin, com bastante humor e uma boa dose de ficção-científica, fruto da ocupação do pai. Em cada aventura, a célula familiar desfazia-se rapidamente porque, enquanto os miúdos se metiam em alguma enrascada, o pai e a mãe ficavam em casa, aflitos e expectantes, aguardando o seu regresso do destino distante e exótico para onde os tinham conduzido as aventuras ingénuas e rocambolescas.
Em Portugal, estes “irmãos mais novos” de Tintin estrearam-se em 1964 na revista Zorro, passando pelo suplemento “Quadradinhos” de “A Capital”, antes da edição em álbum, pela Editorial Verbo, em 1982. A ASA, que actualmente está a reeditar As Aventuras de Tintin, ainda não agendou a reedição desta série, recuperada pela Casterman num único volume em 2008.

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O Mosquito Abriu Asas há 75 anos

A 14 de Janeiro de 1936 chegava aos quiosques portugueses um novo jornal infanto-juvenil. Era o primeiro voo de O Mosquito, “O semanário da rapaziada”, que duraria 17 anos e 1412 números e marcaria de forma indelével os quadradinhos portugueses.

O começo – como toda a sua vida, aliás – foi modesto: apenas oito páginas em formato A4, papel de jornal de fraca qualidade e a presença de uma única cor apenas nas capas e nas páginas centrais. E um preço a condizer: 5 tostões, os oficiais 50 centavos, qualquer coisa como 25 cêntimos nos tempos do euro que hoje vivemos, o que durante muitos anos lhe serviu de bandeira, apresentando-se como “o jornal infantil mais barato”.
Ao leme do insecto, estavam dois dos maiores nomes do jornalismo infanto-juvenil nacional, António Cardoso Lopes, o famoso Tiotónio, já com experiência similar de outras publicações, responsável pelo grafismo, e Raul Correia, que asseguraria grande parte da criação literária da nova publicação, bem como as traduções (livres, quase sempre autênticas novas versões) das bandas desenhadas publicadas. Juntos fizeram de O Mosquito “o primeiro movimento colectivo de rebeldia das crianças em Portugal”, escreve António Dias de Deus em “Os Comics em Portugal” (Cadernos da Bedeteca, Cotovia). Porque, acrescenta, o seu conteúdo fugia às “lindas e bem-formativas revistas, como O Senhor Doutor e O Papagaio”. Por isso, “O Mosquito foi perseguido, confiscado, rasgado, queimado, deitado para o caixote do lixo, anatemizado e esconjurado. Os pais, aparentemente, tinham a razão e a força (…) mas acabaram por perder a guerra”.

Altos voos
E o sucesso foi imediato. Iniciado com uma tiragem de apenas cinco mil exemplares, no auge da sua popularidade atingiu 30 mil, era publicado duas vezes por semana e as máquinas onde era impresso, trabalhavam seis dias por semana, em dois turnos de oito horas!
Combinando novelas ilustradas, textos mais moralistas e bandas desenhadas, recortadas e remontadas, ocupando todos os espaços de cada página, O Mosquito, “o jornal mais bonito”, que ao longo da sua vida mudou de formato cinco vezes e chegou a ter 16 páginas, fez da interactividade com os leitores um dos seus grandes trunfos. Por isso, a par das cartas dos leitores e da publicação das suas fotografias, teve um emblema, multiplicaram-se os concursos, as separatas e as construções para armar. O sucesso crescente levou à criação de colecções paralelas, números especiais, um suplemento para meninas – A Formiga – e emissões radiofónicas, que o fizeram voar atravessando as mudanças de três décadas e de uma guerra mundial.

Histórias memoráveis
Quem leu O Mosquito – quando foi publicado ou anos mais tarde, herdado de pais ou tios – recorda com certeza “Pelo mundo fora…”, “Formidáveis aventuras do grumete Mick, do velho Mock e do cão Muck”, “Jovens Heróis”, “O Capitão Bill, o grumete Bell e o cozinheiro Ball”, “Águias da Lei”, “O Capitão Meia-Noite”, “O Gavião dos Mares”, “Pedro de Lemos, Tenente, e o ‘Manel’, Dez Reis de Gente”, “O Voo da Águia”, “Serafim e Malacueco”, “Anita Pequenita” e, sobretudo, possivelmente, as aventuras do Cuto. E desconhecendo, com certeza, que todas elas eram estrangeiras, a maior parte inglesa, com algumas espanholas à mistura. Quase no final, surgiriam também americanas: “Príncipe Valente”, “Terry e os Piratas”, “Tommy, o rapaz do circo”…
Mais tarde, esta colaboração estrangeira seria quase completamente substituída pela produção nacional. O grande sustentáculo da revista, foi então Eduardo Teixeira Coelho (o célebre ETC), que desenhou “Os Guerreiros do Lago Verde”, “Falcão Negro”, “Os Náufragos do Barco sem Nome” ou o mítico “O Caminho do Oriente” (considerado por muitos Os Lusíadas da BD nacional). “A Casa da Azenha” (de Vítor Péon), “Os Espíritos Assassinos” (Jayme Cortez), “O reino proibido” (José Ruy) ou “O Inferno Verde” (José Garcês) são outros títulos que deixaram marca nas páginas de O Mosquito

O último bater de asas
Com o correr dos anos, a chegada de novos concorrentes – O Diabrete, O Mundo de Aventuras, O Cavaleiro Andante -, a saída de Cardoso Lopes, “uma obcecação pela história pátria e pelos clássicos da língua portuguesa”, escreve António J. Ferreira, outro especialista da BD nacional (em O Mosquito nº 1, V série), a revista perde a rebeldia e “fala cada vez menos à imaginação infantil, tornando-se um prolongamento da escola”.
Chegaria ao fim, de forma discreta, já não era “o semanário infantil português de maior tiragem”, a 24 de Fevereiro de 1953. Mas deixara de tal forma a sua marca, que, escreve Leonardo de Sá no recém-lançado “Dicionário Universal da Banda Desenhada – Pequeno Léxico Disléxico”, o termo “mosquito” chegou a ser usado “para designar em Portugal qualquer revista de histórias aos quadradinhos”.

Outros voos
Por isso, também, se compreende que ao longo dos tempos tenha havido várias tentativas de retomar o título – e o fantástico e o maravilhoso a ele associados. Em 1960, Eduardo Carradinha e José Ruy, autor na primeira série, deram-lhe uma segunda vida, similar à primeira, que durou apenas 30 números. Um ano depois, nova tentativa de renascimento, teve apenas quatro números, mais longa mesmo assim que o número único de prospecção lançado em 1975.
Já nos anos 80, albergando sob as suas asas o melhor da BD europeia de então a par da recuperação de alguns clássicos, O Mosquito voou de novo, durante uma dúzia de números e um Almanaque natalício, na sua última ressurreição. Até hoje.

Quanto vale O Mosquito?
Apesar da sua idade e longevidade, ainda hoje surgem colecções completas de O Mosquito, que podem valer até 7500 euros. O alfarrabista José Vilela, estima que existirão umas 50 no total, mas Alberto Gonçalves, da Timtim por Timtim, refere que, com alguma paciência, gastando mais um pouco, através da internet e procurando em alfarrabistas, é possível completar uma colecção num prazo de um ou dois anos.
Os números mais difíceis, para além dos primeiros, mais antigos, e dos últimos, que tiveram menor tiragem e distribuição, são os que correspondem às mudanças de formato, pois estragavam-se com mais facilidade. Quase impossível, é encontrar as diversas separatas e construções que a revista ofereceu.
De qualquer forma, como este tipo de coleccionismo está geralmente associado à recordação das leituras de infância, são cada vez menos aqueles que ainda procuram O Mosquito.

O Mosquito em números
17 anos (1936-1953)
1412 números
1512 bandas desenhadas curtas
250 bandas desenhadas em continuação
381 contos
425 cartas do Avozinho
180 números de A Formiga (suplemento para meninas)
Tiragem inicial: 5000 exemplares
Tiragem máxima: 30 000 exemplares (duas vezes por semana)
Tiragem no final: 7000 exemplares

José Garcês e José Ruy: autores de O Mosquito relembram revista

Dos muitos desenhadores a quem O Mosquito serviu de escola e de montra, restam quatro: António Gomes Ferreira, Servais Tiago, José Garcês e José Ruy. Os dois últimos, na casa dos 80, continuam a fazer dos quadradinhos o seu dia-a-dia, tendo álbuns programados para o primeiro semestre deste ano.
Em comum, têm também o facto de terem sido leitores d’O Mosquito antes de nele trabalharem. Ruy, que tinha cinco anos quando tomou “contacto com esse tipo de narrativa”, ficou fascinado: “O Mosquito, pelos enredos e pela diversidade de temas, era uma janela aberta para um mundo que os miúdos desconheciam”. Já Garcês, descobriu a revista pelas “construções de armar”, atribuindo o seu fascínio à qualidade “das espantosas bandas desenhadas inglesas, o melhor que havia na altura, ficção muito bem contada e desenhada”.
Desse tempo de leitores, evocam os (futuros) colegas nacionais: Eduardo Teixeira Coelho, Vítor Péon, e, na escrita, Raul Correia e José Padinha; dos espanhóis, em especial Emílio Freixas e Jesus Blasco.
Ruy, que começara no Papagaio aos 14 anos, entrou n’O Mosquito para fazer “a litografia das cores do jornal, legendas e ilustrações” e chegou a ajudar “o Tiotónio na máquina de impressão”, tendo publicado uma única BD, O reino proibido, iniciada no nº 1352.
Quanto a José Garcês, depois de uma passagem pelo Pluto, fez mais cedo a sua estreia “n’O Mosquito, no nº 762, com O Inferno Verde”. Dessa época, recorda “o contacto com grandes autores e a disciplina que criou”, enquanto Ruy evoca “a vertigem que era trabalhar lá, sem rede nem margem para errar”.
Garcês tem como “primeira memória d’O Mosquito, uma visita às oficinas, ainda estudante”, de que guarda “ainda uma prova impressa a partir de um desenho feito para uma chapa de off-set”. Ruy, recorda “um episódio divertido e inusitado: a captura de uma ratazana, das muitas que lá havia, para servir de modelo vivo para uma BD”. Só que, “feitos os desenhos, faltou coragem para matar a bicha; pintou-se-lhe a cauda com tinta de impressão encarnada, mas nunca mais deu notícias”!
Curiosamente, nenhum dos dois possui a colecção da revista. Comenta José Ruy: “em casa de ferreiro, espeto de pau”!

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Mortadelo y Filémon: meio século de disparates

Francisco Ibañez, o seu criador, quer que as suas aventuras continuem quando desaparecer; “Misión: salvar la tierra”, segundo filme de imagem real estreia este ano

Quando se fala de banda desenhada popular (sem que este adjectivo seja depreciativo), diversos nomes surgem de imediato: os heróis Disney, nos EUA, a Turma da Mônica no Brasil, os fumetti Bonelli, com Tex à cabeça, na Itália… e Mortadelo y Filémon, aqui ao lado, na vizinha Espanha.
Estes últimos completam hoje 50 anos – estrearam-se a 20 de Janeiro de 1958, na revista Pulgarcito #1394, da editora Bruguera – sendo uma criação de Francisco Ibañez. Os dois protagonistas, baptizados em Portugal de Mortadela e Salamão (onde foram editados dezena e meia de álbuns, o último dos quais, “Estrelas de Cinema” (2005), pela ASA), respectivamente (in)subordinado e chefe, são uma espécie de agentes secretos e primam pela falta de discrição e de jeito, transformando cada missão num fracasso completo e num caos total. Da galeria das principais personagens fazem também parte o Super, superior hierárquico dos heróis, Ofélia, a sua (muito) gorda secretária, e o professor Bactério, inventor dos mais extravagantes apetrechos.
A série assenta num humor desbragado, quase sem limites nem temas tabus, e num ritmo infernal, onde os gags se sucedem a alta velocidade, sem um único momento de pausa que permita ao leitor respirar o fôlego. Ao mesmo tempo, Ibañez tira todo o partido do seu traço arredondado e extremamente expressivo, com as personagens (em especial Salamão, vítima constante da inépcia de Mortadelo) a ficarem momentaneamente com o corpo deformado, queimado ou quase estropiado, devido aos violentos acidentes – explosões, queda de objectos, portas que se abrem, etc. – que vão sofrendo, como é mais vulgar ver nos desenhos animados. Outra marca da série são as constantes mutações de Salamão, capaz de instantaneamente vestir um disfarce que sirva a sua missão, ou de aparecer transformado em animal, revelando assim o seu estado de espírito, ou até em objecto.
Para além de Mortadelo y Filémon, Ibañez, que nasceu a 16 de Março de 1936, em Barcelona, e espera que alguém prossiga com as suas criações quando desaparecer, criou outros sucessos, que originaram um verdadeiro império de “historietas” (BD espanhola) de humor, como “13, Rue del Percebe”, “El botones Sacarino”, “Rompetechos” ou “Pepe Gotera y Otilio”, sendo normal a interacção entre os protagonistas de todas elas.
Para assinalar os 50 anos da dupla, as Ediciones B editaram “El Gran Livro de Mortadelo y Filémon”, que resume a história de sucesso da série, traduzida também na Dinamarca, Alemanha, Brasil ou Turquia, os seus primeiros passos, as aventuras mais significativas, anedotas, curiosidades, as diversas adaptações em cinema de animação e os filmes de imagem real, HYPERLINK “http://www.mortadeloyfilemon.com/pelicula/” “La gran aventura de Mortadelo y Filemón” (2003) e “Misión: salvar la tierra” (a estrear este ano).


Escrito Por

F. Cleto e Pina

Publicação

Jornal de Notícias

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