Categoria: Recortes

Galeria Mundo Fantasma: 15 anos e muitas celebrações

A livraria portuense de banda desenhada Mundo Fantasma assinala os 15 anos da sua galeria de exposições, contígua à loja, com a exposição dos originais do livro “Variantes – Homenagem à BD Portuguesa”.

Nascido de um projecto, apoiado pelo Programa Garantir Cultura, originou um livro editado pelo colectivo A Seita e pela Turbina Associação Cultural, no qual uma série de autores portugueses homenageiam 25 obras de referência da história da BD Portuguesa, publicadas entre 1872 e 2000, mais exactamente de “Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro sobre a Picaresca Viagem do Imperador do Rasilb pela Europa” até “Tu és a mulher da minha vida, ela a mulher dos meus sonhos”, de João Fazenda e Pedro Brito. O volume abre com uma reflexão sobre aquele período e inclui uma breve apresentação de cada uma das obras e uma das suas pranchas recriada por alguns dos desenhadores mais representativos das gerações actuais.

A mostra dos originais deste projecto, que já esteve patente em Matosinhos, Barcelos e Resende, chega agora ao Porto, sendo inaugurada este sábado, pelas 17h00, na galeria Mundo Fantasma e na ocasião estarão presentes Gonçalo Varanda, Marco Mendes ou Paula Cabral que colaboraram no livro, como, estando também confirmada a presença de outros autores de BD como Daniel da Silva Lopes, Daniel Silvestre, Esgar Acelerado, José Manuel Saraiva ou Paulo J. Mendes, este último recentemente premiado no Amadora BD com o troféu para Melhor Obra de BD de Autor Português, pelo livro “Elviro” (edição Escorpião Azul).

Para além da exposição, o programa comemorativo dos 15 anos da galeria inclui igualmente a apresentação de três obras editadas recentemente pela Kingpin Books: “Há quem queira que a luz se apague”, “Vinil Rubro” e “A Fórmula da Felicidade – edição integral”, com a presença dos respectivos autores: Alice Prestes, Derradé, Mário Freitas, Nuno Duarte e Osvaldo Medina. Todos os autores estarão disponíveis para dois dedos de conversa e sessão de autógrafos.

A Mundo Fantasma está situada no Centro Comercial Brasília, no Porto, e a exposição “Variantes – Homenagem à BD Portuguesa” ficará patente até 7 de Janeiro de 2024.


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F. Cleto e Pina

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Variantes
Ilustração de Pedro Morais.

Descobrir a outra Turma da Mônica

Vítor e Lu Cafaggi mostram a Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali como nunca os vimos
“Laços” é um conto que exala doçura, encanto, o cheiro e o sabor a infância

Foram muitos aqueles que em Portugal, desde os anos 1970, cresceram a ler as revistas da Turma da Mônica, que actualmente, como então, ainda podem ser encontrados em quiosques nacionais.
Ao longo dos anos, mais do que uma vez, foi levantada a hipótese de produção portuguesa de alguns desses títulos, com a linguagem mais adequada ao nosso português, mas no final, curiosamente, a estreia lusa da Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali acaba por acontecer com uma das propostas alternativas da linha Graphic MSP, uma chancela criada no Brasil em 2012, para que autores fora daquele universo, dessem a sua visão pessoal das personagens de Maurício de Sousa.
Uma das primeiras edições foi este “Turma da Mônica: Laços”, dos irmãos Vítor e Lu Cafaggi, que surge agora em edição portuguesa da Bicho Carpinteiro, e foi uma das mais aclamadas e deu mesmo origem a um filme live action no Brasil.
“Laços” é um mergulho deslumbrante no mundo maravilhoso da infância, com as emoções, sinceras e genuínas, à flor da pele, um relato repleto de sonhos, fantasia, imaginação e, acima de tudo, amizade. O que primeiro salta à vista é o desenho doce e bonito dos irmãos Cafaggi e esse deslumbramento prossegue ao longo de uma história simples e directa mas irresistível, bem desenvolvida e com o rimo certo em cada sequência, alternando o texto escrito com a descrição puramente gráfica, em que os laços da amizade de um menino por um cãozinho e dos amigos do menino por ele, conseguem sobrepor-se e fazer ultrapassar os medos, os receios, os fantasmas infantis e o desconhecido. E até transformar em respeito (alguma d)a maldade e crueldade inerente ao mundo em que vivemos.
Como se isto não fosse bastante, Vítor e Lu acrescentaram uma série de referências, gráficas e não só, à cultura pop dos anos 80, à própria Turma da Mônica e às características intrínsecas de personagens que conhecemos há décadas.
Esta dupla leitura, ajuda a que tanto os pais como os filhos possam desfrutar deste belíssimo conto que exala doçura e encanto, o cheiro e o sabor a infância, no qual vamos descobrir o Cebolinha, a Mônica, a Magali, o Cascão e, claro, o Floquinho, como nunca os vimos, para nos rendermos e apaixonarmos.

Turma da Mônica: Laços
Vítor e Lu Cafaggi
Bicho Carpinteiro
80 p., 16,95 €


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F. Cleto e Pina

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Novo Blake e Mortimer foge à tradição

História de espionagem no tempo da Guerra Fria, apresenta grafismo original

“A arte da guerra” é o título do novo álbum de Blake e Mortimer que chega esta terça-feira às livrarias, em simultâneo com a edição original francófona.
Para aqueles que têm lamentado o mimetismo imposto aos sucessores de Edgar P. Jacobs, este livro poderá representar uma lufada de ar fresco.
Se as sucessivas retomas têm clonado os excessos de texto descritivo e o modo como repisam o que as imagens mostram, perdendo o tom actual e de antecipação científica que as histórias de Jacobs ostentavam, esta apresenta-se como uma história de espionagem pura e dura, praticamente despojada de qualquer referência científica, em plena Guerra Fria.
Situado após “O Mistério da Grande Pirâmide” e a II Guerra Mundial, o argumento assinado por Jean-Luc Fromental e José-Louis Bouquet, os mesmos de “Oito horas em Berlim”, leva os protagonistas até Nova Iorque, onde Blake deverá discursar em defesa da paz na Assembleia Geral das Nações Unidas.
Graficamente, as diferenças em relação ao original e às sucessivas retomas são também evidentes, com Floc’h, um dos expoentes da linha clara, a apresentar um traço extremamente depurado, servido por cores vivas e planas, completamente despido dos pormenores que eram a marca de Jacobs, e optando por uma planificação que frequentemente se limita a três ou quatro vinhetas por página, o que contribui para que o álbum tenha o dobro das páginas habituais. Com o desenho assim solto e mais arejado, inovando respeitosamente em relação a Jacobs, a narrativa ganha em ritmo, sem prejuízo da sua consistência.
Inevitavelmente Olrik faz parte da galeria de participantes, em lugar de destaque, sendo a mais evidente das muitas referências que Fromental e Bouquet fazem à banda desenhada original de Jacobs, algumas delas bem-humoradas e até mordazes.
Apelo nostálgico a quem descobriu os heróis na adolescência, uma vez que os leitores mais jovens têm o manga no topo das suas preferências, Blake e Mortimer continua a ser uma franquia com vendas muito interessantes. “Oito horas em Berlim”, foi a quarta BD mais vendida em França no ano passado, com 244 mil exemplares. Em Portugal, se os números são bem mais modestos, são igualmente significativos face à dimensão do nosso mercado de BD. Segundo informação da ASA ao JN, cada nova edição tem uma tiragem de 5 mil exemplares e nos últimos 5 anos as vendas da série ultrapassaram os 40 mil livros.
Entretanto, hoje chega também às livrarias a reedição do 14.º álbum de Blake e Mortimer, “A Conspiração Voronov”, de Yves Sente e André Juillard.


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Léonard sem ideias e Robin Dubois sem assaltos: faleceu Bob De Groot

Bob De Groot faleceu ontem, contava 82 anos. O génio Léonard vai ficar sem ideias e Robim da Mata vai deixar de assaltar os ricos e de fazer a vida negra ao xerife de Notthigham.
Nascido em Bruxelas, a 26 de Outubro de 1941, apesar de ter feito carreira como argumentista, até começou por ser desenhador, depois de ter frequentado durante três anos uma academia de artes. Uma mini-Bd na revista “Spirou” marcou a sua estreia nesta arte, tendo depois integrado o estúdio de Maurice Tillieux. Em 1967, entra para a equipa da “Pilote, onde assinará diversas histórias curtas, com Hubuc, Reiser ou Fred.
Seria no entanto o encontro com Philippe Liégeois, mais conhecido como Turk, que iria mudar a sua carreira. Partilhando com ele o gosto pelo absurdo e pela animação de Tex Avery, desenvolveram uma longa parceria onde se destacam “Archiméde”, “Robin Dubois”, versão caricatural do salteador que roubava os ricos para dar aos pobres ou o inventor “Léonard”, génio incompreendido da Idade Média.
Bob De Groot também emprestou a sua escrita a diversos heróis de sucesso, como Clifton, Chlorophylle, Modeste e Pompon, Rantanplan e, principalmente, “Lucky Luke”, de que escreveu os episódios “O bandido maneta”, ainda desenhado por Morris, “Marcel Dalton” e “O artista pintor”.


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O preço da honra e o valor da vida

Obra-prima de Hiroshi Hirata finalmente editada em Portugal
Relato de contornos históricos, privilegia o lado humano dos confrontos em batalha

Se é verdade que o manga é um dos géneros mais editados mensalmente em Portugal, no que à BD diz respeito, entre os estereótipos que lhe estão associados, as narrativas de samurais têm sido pouco exploradas no nosso país. “O preço da desonra”, edição do coletivo editorial A Seita, é uma exceção recente. E é, simultaneamente, uma forma de dar a conhecer aos leitores portugueses um dos expoentes do género, o autor Hiroshi Hirata (1937-2021).
Curiosamente, se esta temática potencia aventura e acção a rodos, a verdade é que esta abordagem de Hirata vai mais no sentido da exploração de vertentes mais intimistas: o receio da morte no campo de batalha, a incapacidade de fazer face às situações limite que os combates propiciam, o facilitismo de virar costas em lugar de se deixar matar pelo oponente… e as suas consequências.
Reacções bem humanas, dirão alguns, com razão, mas que no contexto histórico em que se desenrola a acção e tendo em conta o código de honra do bushido pelo qual se regiam os guerreiros, eram de todo reprováveis e condenáveis. E aqueles que as assumiam, em troca de um valor monetário chorudo que se obrigavam a pagar mais tarde ao oportunista que os poupava, apesar da salvação momentânea, mantinham a vida em risco e, mais do que isso, colocavam em causa a sua honra.
O protagonista deste volumoso “O preço da desonra”, é, assim, um cobrador destas dívidas, alguém que meses ou anos mais tarde vem resgatar as promissórias assinadas com sangue nos campos de batalha. O problema é que, geralmente, por falta de meios, receio do opróbrio ou face à vida entretanto desenvolvida sobre aquela mentira, essa cobrança, feita ao próprio ou aos seus familiares, se revela complicada. E se, em determinados momentos, a acção, consubstanciada em confrontos plenos de dinamismo e movimento, acentuado pela mestria no uso de linhas cinéticas de movimento, é a única forma de cumprir o objectivo, a verdade é que Hirata, através do seu traço realista num preto e branco expressivo, privilegia as emoções e aborda as implicações sociais e familiares numa época em que estas tinham uma importância transcendente, aprofundando o lado humano deste relato de contornos históricos, em que destaca o desespero daqueles que um dia, face à morte, escolheram o elevado preço da vida.

O preço da desonra
Hiroshi Hirata
A Seita
396 p., 22,99 €


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Léonard sem ideias e Robin Dubois sem assaltos: faleceu Bob De Groot

Bob De Groot faleceu ontem, contava 82 anos. O génio Léonard vai ficar sem ideias e Robin Dubois (Robim da Mata na versão portuguesa da “Tintin”) vai deixar de assaltar os ricos e de fazer a vida negra a Fritz Alwill, xerife de Notthigham.
Nascido Robert De Groot, em Bruxelas, a 26 de Outubro de 1941, apesar de ter feito carreira como argumentista, começou como desenhador, depois de ter frequentado durante três anos uma academia de artes. Uma mini-Bd na revista “Spirou” marcou a sua estreia nesta arte, depois de integrar o estúdio de Maurice Tillieux, para quem trabalhou em dezenas de pranchas de “Félix”. Nos anos seguintes publica em diversas publicações e, em 1967, entra para a equipa da “Pilote”, onde assinará diversas histórias curtas, com Hubuc, Reiser ou Fred.
Seria no entanto o encontro com Philippe Liégeois, mais conhecido como Turk, que iria mudar a sua carreira. Partilhando com ele o gosto pelo absurdo e pela animação de Tex Avery, desenvolveram uma longa parceria onde se destacam “Archiméde” (na “Spirou”), “Robin Dubois” (“Tintin”), versão caricatural do salteador que roubava os ricos para dar aos pobres, ou o inventor “Léonard” (“Achille Talon Magazine), génio incompreendido da Idade Média.
Para além destas criações próprias, Bob De Groot também emprestou a sua escrita a diversos heróis de sucesso que marcaram a época de ouro da revista “Tintin”, como o detective Clifton, Chlorophylle, Modeste e Pompon e, principalmente, “Lucky Luke”, de que escreveu os episódios “O bandido maneta”, ainda desenhado por Morris, “Marcel Dalton” e “O artista pintor”. Seriam também da sua autoria diversos álbuns de Rantanplan.
Presença regular na versão portuguesa da revista “Tintin”, Bob De Groot viu editados em Portugal os álbuns de Lucky Luke que escreveu, bem como alguns de Rantanplan e Léonard.
Embora mais conhecido pelas suas criações humorísticas, De Groot também tem na sua bibliografia obras realistas, como “Des Villes et des Hommes”, com arte de Francq, e “Sam Grifith”, com André Taymans e Jean-François di Giorgio.
Recentemente, integrado na comemoração dos seus 77 anos, a editora Lombard editou um projecto que De Groot e Turk criaram em 1987 quando, durante um ano, publicaram semanalmente uma imagem da mesma rua na revista “Tintin”, formando, no final, um fresco de 15 metros de extensão, batizado como “La Plus Grande Image du Monde”.
Bob De Groot, que tinha abandonado a escrita em 2015, para se dedicar à família, será relembrado como um argumentista que dispôs bem sucessivas gerações de leitores.


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Molhar os pés ou mergulhar no abismo

Narrativa experimental e intimista sobre a relação com o mar
Crescimento do mercado possibilita apostas mais diversificadas e obras mais exigentes

O assinalável crescimento do mercado nacional de banda desenhada, para além do fortalecimento dos segmentos dominantes de franco-belga e manga, trouxe também a aposta de editoras que geralmente não se dedicavam a este género narrativo e uma maior diversidade da oferta.
Exemplos disto, são as biografias e as adaptações de obras literárias e também as novelas gráficas, termo que mais não indica do que bandas desenhadas mais longas e/ou de temática mais exigente.
“A Ilha”, recém-editada pela Levoir, é um exemplo da diversidade referida, pelo seu carácter experimental e tom intimista.
Trata-se de uma história contemplativa, com páginas quase sem texto mas em que, em fundo, quase ouvimos ou adivinhamos o ir e vir do mar, as ondas a espraiarem-se na areia ou a sua rebentação nas rochas, o cheiro a maresia, a sensação agradável de molhar os pés ou a tentação do abismo, de caminhar em frente indefinidamente, mar adentro.
Com a acção – ou a ausência dela? – a ter lugar numa pequena ilha isolada, Mayte Alvarado, a autora, reflecte a relação a um tempo próxima, respeitosa e receosa, que os poucos habitantes têm com o mar, que tanto é fonte de vida e subsistência como pode ser carrasco e túmulo.
“O mar tem sempre fome” diz alguém a quem chamam louco – com a loucura provocada pelo mar que, em troca de tudo o mais, lhe levou o filho, deixando em troca a dor da perda, a solidão e até o remorso. Ele é uma das personagens desta história, juntamente com uma rapariga, os pescadores e as crianças, símbolos de tantas comunidades que vivem do mar ou apesar do mar, até este querer ou deixar.
Pela forma como as vinhetas se fundem umas nas outras e em que as páginas abertas, pintadas com cores vivas e planas, que evocam a areia e, essencialmente, o azul do mar, e fogem muitas vezes aos canônes mais tradicionais da narração em quadradinhos, este relato envolvente, sem ter propriamente princípio, meio e fim, espelha momentos da relação do homem com o oceano e cada leitor intuirá dela coisas diferentes, em função da sua interpretação e até da própria relação com o mar, pelo que “A Ilha” convida a visitá-la uma e outra vez…

A Ilha
Mayte Alvarado
Levoir
152 p., 27,90 €


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Coimbra BD regressa em português

Convento de São Francisco acolhe evento de três dias

É já amanhã que abre as suas portas o Coimbra BD que, na sua sétima edição apresenta um programa integralmente dedicado à banda desenhada nacional.
Foi uma edição atribulada, com questões orçamentais na génese do problema, que começou por não fazer parte da agenda da câmara local, foi depois anunciada para o primeiro semestre, com novos programadores, e acaba por surgir agora, em Novembro, com o regresso da equipa organizadora inicial, que de alguma forma pretende fazer desta uma edição zero, para retomar depois a data original (Março) e a dinâmica anterior que o festival exibia.
Este ano o Coimbra BD deixa a Casa da Cultura para se sediar no Convento de São Francisco e o programa apresenta-se bastante diversificado pois, para além da banda desenhada, haverá igualmente jogos de tabuleiro, videojogos, oficinas e hora do conto para os mais novos, exibição de curtas-metragens de animação, desenho urbano e com modelo ao vivo, concurso de cosplay e a participação da Legião 501 & Rebel Legion saídas do universo Star Wars.
No que ao tema base do evento diz respeito, estarão patentes duas exposições, uma dedicada a “The Mighty Gang”, de Joana Rosa, e outra aos cartazes das várias edições do Coimbra BD. Nesta área, em termos de programação, o destaque vai para os debates com Jorge Coelho e Miguel Mendonça sobre a sua experiência no mercado norte-americano de comics, no sábado, e a conversa com Luís Louro a propósito dos 29 anos do Corvo , no domingo. Estão também agendadas diversas apresentações de livros de autores portugueses, nomeadamente “The Mighty Gang #2”, de Joana Rosa, “A Fórmula da Felicidade – versão integral”, de Nuno Duarte e Osvaldo Medina, e “Vinil Rubro”, de Mário Freiras e Alice Prestes.
Nas sessões de autógrafos do fim-de-semana, para além dos autores já citados, será possível encontrar e trocar algumas palavras com Joana Afonso (autora do cartaz), Rita Alfaiate, Raquel sem Interesse, Filipa Beleza e Derradé.
O festival abre as suas portas amanhã, às 10 horas, encerra domingo, às 18 horas, e a entrada é livre.


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F. Cleto e Pina

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Ver a vida passar a correr

Literatura e exercício físico balizam auto-biografia de Alison Bechdel
Reflexão irónica e cativante sobre si própria e as mudanças estruturais da sociedade norte-americana desde 1960

A correr, principalmente, mas também a escalar, fazer montanhismo, ioga, esqui nórdico, andar de bicicleta, praticar karaté e todos os tipos de exercícios de manutenção da forma (e algo mais) que foram estando na moda nos últimos 60 anos.
Na verdade, “O segredo da força sobre-humana”, edição recente da Relógio d’Água em português, é uma longa revisão auto-biográfica de Alison Bechdel que, emulando a velha máxima que diz que nos últimos momentos vemos a nossa vida a passar diante dos olhos, nos permite contemplar a sua, desde os anos 1960 até a actualidade, muitas vezes sob a influência de álcool e/ou medicamentos e balizada por dois aspectos que até costumam ser mutuamente exclusivos: por um lado a obsessão com o exercício físico, por outro, a paixão pela literatura e por nomes como Kerouac, Coleridge, Wordsworth, Buda… Do primeiro, refere equipamentos e acessórios, efeitos e a própria dedicação, enquanto que nos segundos, com quem estabelece curiosos paralelismos de vida, procura inspiração e/ou justificação.
As relações complicadas com o pai e a mãe – já exorcizadas, respectivamente, em “Fun Home” (Contraponto, 2012) e “Are you my mother?” (inédito em português) – as suas escolhas de vida, em termos de estudos, orientação sexual e opções profissionais, com a banda desenhada, a impor-se progressivamente, vão desfilando perante o olhar do leitor, à medida que este vai voltando as páginas.
Com um traço solto, neste livro servido pela primeira vez pelas cores de Holly Rae Taylor, e um grande à-vontade na planificação que torna a leitura fluída e dinâmica, Bechdel exibe aqui uma certa ironia cativante e com que se questiona, que contrasta com as suas dúvidas existenciais e com o negativismo que a assoberba constantemente.
Apesar desta aparente leveza e simplicidade narrativa, que o relato desconstrói e nega, revelando como o acto criativo tem sempre para Bechdel uma elevada quota de esforço, transpiração e auto-imposição, há muito para descobrir nas entrelinhas de “O segredo da força sobre-humana” pelo que se recomenda mais do que uma leitura desta viagem que, sendo primordialmente pessoal, também nos leva em passo de corrida pelas mudanças estruturais da sociedade norte-americana, nomeadamente ao nível da concessão de oportunidades e reconhecimento das mulheres.

O segredo da força sobre-humana
Alison Bechdel
Relógio d’Água
248 p., 19,50 €


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Heróis do fumetti perdem Carlo Ambrosini

Desenhou Dylan Dog e Tex e foi o criador de Napoleone e Jan Dix

O desenhador italiano Carlo Ambrosini, conhecido pelo seu trabalho em Dylan Dog, Napoleone ou Jan Dix, faleceu ontem aos 69 anos, na sequência de problemas de saúde que se vinham a agravar.
Natural de Brescia, onde nasceu a 15 de Abril de 1954, descobriu a banda desenhada em criança. Com inclinação para o desenho, seguiu uma formação artística que concluiu com um diploma em pintura na Academia de Belas Artes de Brera, com a ideia de se dedicar a esta arte, usando eventualmente a ilustração como meio de subsistência.
No entanto, era a banda desenhada que esperava por ele e assim, em meados dos anos 70, estreou-se nas páginas de “Dardo”, uma série de temática bélica, trabalhando depois para as editoras Ediperiodici e Editoriale Corno.
Segundo o próprio Ambrosini, no entanto, “a estreia a sério em BD” aconteceu em Janeiro de 1980, quando foi publicado “Pellerossa”, no número 26 de Ken Parker, a primeira de uma dezena de participações neste western de contornos humanistas.
Dono de um traço fino e realista, Ambrosini foi capaz de o adaptar a diversos géneros. Desta forma, nos anos seguintes alternou o western com o relato histórico medieval em “Nico Macchia”, até que em 1987 se estreou na Sergio Bonelli Editore, com “Channel 666”, décimo-quinto tomo de Dylan Dog, um misto de policial e terror em ambiente contemporâneo londrino, cuja equipa criativa passou a integrar.
Para esta personagem, desenhou “O Imenso Adeus” (1995), a sua única obra publicada em Portugal, pela cooperativa editorial A Seita, antecipando a sua visita ao Coimbra BD 2020, que não se realizaria devido à Covid-19, sendo a visita do autor ao nosso país concretizada no ano seguinte, no Festival Internacional de BD de Beja. Escrito por Tiziano Sclavi, “O Imenso Adeus” é uma bela história de amor, triste, melancólica e onírica, em que Dylan reencontra uma paixão da juventude.
Com o passar dos anos, Ambrosini começou também a escrever os argumentos do Detective do Pesadelo, mas em 1997 decidiu entregar-se completamente a uma criação pessoal, “Napoleone”. Graficamente inspirado em Marlon Brando, Napoleone é um investigador que privilegia a reflexão em lugar da acção, num registo de policial negro, influenciado pela pintura e por alguma literatura da Europa Central, e com um toque de fantástico.
O seu segundo grande projecto pessoal seria “Jan Dix”, em 2008, uma dupla homenagem ao pintor abstrato Jackson Pollock e ao actor Jeremy Irons. Consultor de arte no Rijksmuseum de Amesterdão, Dix ocupa-se da aquisição, recuperação e busca de obras de arte.
Da sua bibliografia, onde constam igualmente volumes das colecções “Le Storie” e “Il Confine”, surge como ponto alto o convite para desenhar um “Texone” (Tex Gigante), proposta reservada apenas a grandes nomes da banda desenhada mundial. Foi dessa forma que 2005 assistiu à publicação de “O Preço da Vingança”, um western de contornos tradicionais. A história escrita por Claudio Nizzi começa pela perseguição de um bando de índios rebeldes responsáveis por acções violentas, instrumentalizados por brancos interessados em se apossarem de terrenos que têm ouro, mas em paralelo irá surgir uma história mais humana sobre uma de vingança adiada, que culminará num duelo dramático e de desfecho surpreendente. A história foi trabalhada superiormente por Ambrosini que, assim, comprovou o carácter camaleónico do seu traço e a sua capacidade de representar qualquer tipo de ambiente.


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F. Cleto e Pina

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